terça-feira, 30 de outubro de 2012

CORAGEM

não podendo tomar
algo mais forte
resolveu tomar coragem
o gole seco
irrompeu os caminhos
explodiu em luzes
tanta claridade
vomitaria o sol
se houvesse boca
escalaria o dia
se houvesse unhas
tão calmas estrelas
quase um céu apagado
não se mostrasse a escuridão
seria esquecida

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

DIVIDA

devo
devo o nervo
até o caroço
devo um troço
devo ir
devo um almoço
devo ser moço
devo
devo ser rico
devo ser podre
devo
ter sangue nobre
devo
aos fios cobre
aos rios molhe
azias esnobes
devo
devo algum negócio
devo ócio
até o pescoço
devo ter vida
devo ter divida
devo ter dúvida
até de quem duvida
devo
não prego
caibo
quando me der

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

HORIZONTAL

sempre acordo melhor
do que dormi
todos os dias
desperto melhor
assim tudo
fica mais fácil
suportar o peso
da terra
sobre o corpo

COMEÇOU A POESIA

a poesia começou
quem quiser flores
procure o florista
quem quiser cores
procure o analista
quem quiser amores
procure alguém propenso ao fracasso
restou o poeta
e a página em branco
limitada às palavras

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

DO TAMANHO DA ÁGUA

um anjo
acende as asas
e queima a
paisagem ao redor
e eu
que provocava
incêndios aqui na terra
me sinto pequeno
libero
minhas águas

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

SUPERFÍCIE

choro submerso
confundem meu corpo com o lago
largo
procuro me tornar
o mais próximo do oceano
pareço claro
padeço
são de ares meus passos
desconheço
minhas pegadas
se eu não morrer
nunca entenderei porque existem
se eu não escorrer
nunca entenderei a superfície

IDIOMA

quem leu minha mão
no original
entende o idioma
dos meus gestos
língua rara
de sabor estranho
penetra seca o silêncio
como se tivesse tamanho

domingo, 21 de outubro de 2012

MURO

a lucidez
murou meu sonho
eu seria uma paisagem
ou um personagem
de algo
com final desconhecido
mesmo nulo
falo gesticulo
por dentro
do muro de vidro

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

BIGORNA

um artista
nunca se esgota
mesmo esmagado
sobre a bigorna
sua cabeça em chamas
acaricia a cabeça
do martelo

PARECE FÁCIL

viver
parece fácil
principalmente para o morto
permanece imóvel
com sua respiração presa
a lágrima presa
a vida presa
entre a madeira e as fotos
o espirro preso
pelos odores
das coroas de flores

ANTES DO CANTO

existir
antes do canto
desse modo
a poesia nos desabilita
pensamos extrapolar o mundo
no entanto
nada fica

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

DERIVADAS

já visitei lugares
mais quentes que o inferno
já fui solução de várias derivadas
beijei milhares de sapos
e não encontrei o meu príncipe
meu desespero é mais curto
que os meus cabelos
quase na altura dos meus olhos
quando nos encaramos
descubro o meu
verdadeiro tamanho

terça-feira, 16 de outubro de 2012

EROSÃO

o mar tornou-se o que queria
quem ver o azul não sabe o sal
quem sabe o sal não sente azul
límpido de salgar
liquido de sedar
por onde correm os círculos
o barulho do mar faz estragos

DISFARCES

estranhas meus ossos
parecem feitos de plástico defumado
parecem fetos
contorcidos de afetos
parecem fatos
antes de acontecidos
parecem sonhos
antes de adormecidos
cavernoso corpo intumescido
jorra indícios de sorrisos na face
empresto minha pele aos disfarces
quem não me sabe
engole tudo que não cabe

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

CORAÇÃO

espero que o meu coração
pare
no local exato
de enxergar tudo
espero que o meu coração
me veja

ESPAÇO


há pouco espaço
entre um poema
e um abraço
caberia a poesia
se ela soubesse
que não se sujaria

PUREZA

porque é um diamante
não quer dizer
que entenda de pureza
mesmo as flores de pedra
produzem sombras

QUASE UM MADRIGAL

as flores que não alcanço
amassam o meu olhar
esse líquido sonoro
afeta a minha escolha
parece uma dança
caminhar entre as árvores
mesmo que elas pisem
constantemente em meus pés
não perco os passos
e os penduro em cada galho
na esperança que algum dia amadureçam

terça-feira, 9 de outubro de 2012

BOCA VAZIA

nada cruza
o céu da minha boca
nem a minha fala
cuspo as estrelas
evito comê-las
sem que o céu caiba

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

DESVÃOS


o dinheiro corre
nas artérias da cidade
os pulmões das árvores
as que se sabem
sustentam o pó dos escapes
surge eventualmente
algum homem que logo some
entre a alcova e a cova

RÉCITA

começa a recitar
como se a poesia
fosse feita para acalmar
enquanto isso
a alma transborda lá fora
e com o silêncio
o que fazer agora?

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

MORDIDOS

quem se esmaga
sabe o que os dentes mordem
quem sabe dos dentes depois do sorrir
sabe por que se morre
quem sabe o que vale
nunca vale o que move
ultrapassa o espaço do fim
e no fim se comove


VERDADE

eu deveria ter escolhido a verdade
assim morreria mais cedo
esse meu medo
de a mentira prolongar meu destino
tornou minha palavra segredo
a mentira deveria ter me escolhido
assim viveria sem medo
esse meu modo
de prolongar meus caminhos
interrompeu minha vida mais cedo

RARIDADE

nada faz o mundo claro
mesmo quem não existe
o mundo me faz triste
a poesia me faz raro

PONTO CEGO

a palavra passou
nem vi

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

PARIS

a lua paira sobre a torre
como uma auréola
pulo do concorde
e chego antes
cada osso do meu corpo
um monumento
cada monumento
um osso do tempo
as nuvens do meu corpo
não estranham
as teias que se formam
no futuro da entranha

RESUMO


então são essas
as palavras
eu preferiria gestos
mas estou ocupado
fabricando chamas

RAJADA

enquanto eu falava
sobre as folhas
que cobriam o lago
o vento foi mais rápido
e afogou o lago

PERGUNTAS

não me pergunte
talvez eu responda
e a resposta esconda
a verdadeira pergunta
não me pergunte
talvez eu não saiba
a melhor resposta
não me pergunte
a resposta certa
pode não ser
a mais correta

SOB O TÉDIO

durante o inverno
chove mais
sob o meu tédio
enquanto me enxugo
por mais que remeta
minha cabeça
contra o muro
tudo permanece escuro
por mais que eu não mereça
a vida se esvai
mesmo sem furo

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

POEMA DE G.VIEIRA

TEU PRESENTE

no teu aniversário
se guarde no armário
num frasco de perfume
se esconda e suma
pra que o tempo chegue
e não te ache e assim passe
sem ver os disfarces
que ocultas na face
da criança que embalas
pra teu presente

DEPOIS QUE MORREM

  sei para onde vão as mães depois que morrem a saudade forma um túnel e a luz que vem em sentido contrário as transformam em cinz...