quinta-feira, 31 de maio de 2012

HERANÇA

colhi as flores de pedra
colhi os frutos cinzentos
colhi onde começa o mundo
colhi tudo que não foi dito
revirei os escombros
e em nada disso me encontrei

quarta-feira, 30 de maio de 2012

SR MERDA

estava distraído
quando foi comido
não tinha a menor idéia
do que era ser mastigado
não tinha a menor idéia
do que era ser engolido
ou do que era ser digerido
não tinha a menor idéia
do que era ser defecado
agora sabe de tudo
e entende tudo
que conheceu por dentro
tudo ficou esclarecido
e da maneira que ficou
sabe que nunca mais
será comido

terça-feira, 29 de maio de 2012

UM LUGAR

enquanto me aguardo
lembro de um bom lugar
onde eu mantinha as pernas suspensas
e o corpo pendurado pela água
nem sei se o lugar existe
mas o lugar tem mais importância
do que a sua existência

MORDER É MELHOR QUE SORRIR

prefiro morder a sorrir
o riso não me alimenta
pelo contrário
provoca sempre ligações
com algo que provocará fome
melhor morder antes

segunda-feira, 28 de maio de 2012

BARQUINHO

o barquinho de papel
da infância
desceu o córrego
sem mim

VENTO

é de vento
o material utilizado
na formação do tempo
talvez por isso se acumule
entre os furos da morte
e do futuro

MARCA DO MUNDO

o mundo passa
deixa a marca
em nossos rostos
escondemos nossos mortos
de um mundo
que não temos

MOMENTO DE FELICIDADE

a morte não pensa em mim
também não penso nela
prolongo o meu olhar
até onde posso alcançar
faço o mesmo com a respiração
meu coração tenta
um ritmo diferente
mas a alma não acompanha
a felicidade é um momento
que não percebemos

sexta-feira, 25 de maio de 2012

FACA DA PALAVRA

nem tudo que corta
gosta de sangue
também nem toda palavra
gosta de ser poema
a palavra que cobre o pensamento
e se mostra quase compreensível
é pincelada de espanto
e corte desprezível
para que se torne poema
melhor continuar a palavra
representando uma faca
que penetra no espaço em branco
mostrando um sangue
que nunca se acaba

quinta-feira, 24 de maio de 2012

A DOR E SUA INUTILIDADE

dói menos
não servir pra nada
enxergar a dor em um poema
ou em qualquer palavra
é um exagero
a dor não precisa
dessa rotina
entre nascer e morrer
ela de encaixa
e não se deixa morrer
por ser a mais humana
sobrevive ao que é visto
engolindo os cacos da calma

terça-feira, 22 de maio de 2012

COISA

a palavra coisa
é estranha
adjetiva tudo
e nada
subjetiva outras coisas
significa todas as outras palavras

NO ESCURO

poucas coisas
proliferam no escuro
a poesia é uma delas
a poesia não precisa de luz
usa o barulho para se aquecer
a poesia não se move
remove quem se põe a ler

sexta-feira, 18 de maio de 2012

EXUBERANTE

o céu me navega
sem me negar
se é que me ergue
sou profundo
inabalável modo
de ser profuso

quinta-feira, 17 de maio de 2012

CLARIDADE

a claridade interrompe as abóbodas
colunas de ar mastigam a tarde
procuro as penas de qualquer asa
o vôo cumprirá parte do sonho
sempre que fui triste me neguei
noutros momentos tive a claridade
passo em falso alimenta
a atmosfera que amedronta
não vale a pena ser triste
ser alegre paralisa
melhor ficar assim
entre um poema e outro
como se a vida desaguasse

PENSAMENTO LIVRE

meu pensamento livre
aprisiona a palavra
entre o olho e a página
meu pensamento livre
é solitário
ao conhecer outro
aprisiona-se
meu pensamento livre
deixa sempre
alguma coisa no caminho
quem não me ouve
sabe do que é feito
meu pensamento livre

quarta-feira, 16 de maio de 2012

SÉCULO 21

as pessoas pensam que
as pessoas mais velhas
sabem mais
é verdade
os mais velhos sabem mais
sabem inclusive que afirmar
que os mais velhos sabem mais
é uma tolice

as pessoas pensam que
quem escreve
sabe tudo
não é verdade
justamente por não saber de nada
é que as pessoas escrevem
o aprendizado consiste em escrever

as pessoas pensam que
sonhar requer um esquema
algumas vezes sim
requer cansaço e insônia

as pessoas pensam que
amanhã o dia será diferente
não é verdade
amanhã o dia será igual ao de hoje
e o de hoje será igual ao de amanhã

a raiva que arranha
ou a alegria que cicatriza
são sujeiras que a paisagem se permite
mas não se altera
nem altera o olhar


ESCOLHAS

então a sua escolha foi essa
o que foi descartado nem existe mais
reimprimir sobre a página já impressa
vai tornar o texto confuso
resta ler o que sobrou
de preferência em voz alta
a vida não permite
leituras silenciosas
nem textos com ponto final

terça-feira, 15 de maio de 2012

O ZÍPER DO CÉU

quando descobri
o zíper do céu
já era tarde
a terra já havia
me engolido
das flores terminais
que enfeitam esse estômago
no qual me vejo perdido
brotam o som
de um céu antigo

RISCO DA ESCURIDÃO

a escuridão reduz
os riscos de estrondos
porque a escuridão
é a luz quando implode
o tato um dos fragmentos
o tropeço outro fato
lembra o sabor do sol
morder a luz por dentro

segunda-feira, 14 de maio de 2012

ALMA DO POETA

poeta não precisa de alma
a poesia é o seu corpo
e a alma forma-se no espaço
entre o poema e o olho

sexta-feira, 11 de maio de 2012

DESMAIO - poema de G.VIEIRA

veio maio sem mais
nem menos desmaios
da dor
de saber-se nada
sem mês, sem mais
maio vem
aos poucos mortais
que vivem em desmaios
de terem demais
todos os maios
para tão desiguais



visitem www.todapalavratoda.blogspot.com

MISTURADO AOS RESTOS

as estrelas
não entendem
o meu brilho
sob os seus pés
mistura-me aos restos
dos cigarros
sou a mera fumaça
que a luz atravessa
e me despedaça

RESOLUÇÃO

foi resolvido pelo sangue
onde posso morrer
todos esses furos
conto como pedaços
dentre todos os objetos
palavras sem mim
encaminham o meu fim

quinta-feira, 10 de maio de 2012

JARDINS SUSPENSOS


sem palavras
suspendo os jardins
mas as flores não caem
irrigo o vazio
com o que crio


TESOUROS

a partir do
deserto do olho
ergui os meus
tesouros
o que não vejo
é o que mais tenho

JARDIM

observe como
eu manipulo as folhas
faço parecerem flores
sem as limitações
das cores
manipulo as folhas
como se eu
fosse verde

quarta-feira, 9 de maio de 2012

terça-feira, 8 de maio de 2012

DESENHOS DE CHUVA

a árvore desenha a chuva
a chuva desenha os meus olhos
meus olhos bóiam na água
bóiam na água salgada
de quem pescá-los
espero clemência

POR ENQUANTO OSSOS

cogito
logo ergo o sol
utilizando os pés
deixo as mãos livres
para o poema
e outras coisas pequenas
como a vida ou uns abraços
e demais gestos
que parecem preciosos
mas não passam
dos ossos que a morte usa
enquanto espera a pele crescer

segunda-feira, 7 de maio de 2012

MAIS PARADO QUE A CHUVA

o tempo me deixa parado
mais parado que a chuva
quando tremula por dentro
parece um sentimento
esse vento que tremula por dentro
mas é só o vento

EQUAÇÕES

existem inúmeras
equações sem soluções
a poesia é uma delas
o x da questão
são as palavras
cada letra uma incógnita
a ser desvendada

sexta-feira, 4 de maio de 2012

DE OLHOS FECHADOS

quem abre os olhos
enxerga principalmente
o que não deseja

até um cego encontra
abismos inesperados

eu mantenho os olhos
sempre fechados
enxergo abismos

enxergo palavras impronunciáveis
escrevo abismos

quinta-feira, 3 de maio de 2012

ABORTO

nunca pensei em ser triste
não me lembro da minha prisão de água
não me lembro da luz na minha pupila dilatada
não lembro se pensei em ser triste
dizem que me dou bem com a vida
não sabem que disfarço bem minhas feridas
não sei me segurar na água
escorro pelos canos
alimento rios oceanos
o mundo absorve o meu sangue e me descarta

ABERTO

eu precisava de um poema
faltou o ar
nem todas as janelas foram suficientes
o balão de oxigênio
misturado aos outros balões coloridos
meus pulmões doloridos
procurei palavras
só encontrei as erradas
para tudo que era certo
eu ia escrever aborto
escrevi aberto

DESPINDO A DOR

aos poucos
a dor se despe
e o que parece sangue
é nada mais que corte
e o que parece humano
é nada mais que morte

quarta-feira, 2 de maio de 2012

POR MAIS

por mais que eu mastigue
as palavras não tomam
a forma da minha boca
por mais que eu me intrigue
a morte não toma
a forma do meu corpo
por mais que eu escreva
as palavras não me tomam
permaneço dessa forma

SE EU FOSSE UM RIO

se eu fosse um rio
seria largo
e quando respirasse
inundaria o mundo
se eu fosse um rio
seria claro
e quando me movesse
acalmaria o mundo
se eu fosse um rio
seria muito
e morreria como se coubesse
no mundo

terça-feira, 1 de maio de 2012

OS LADOS DA VIDA

às vezes
sinto a morte
em alguma parte
do meu corpo
algo para e apodrece
e alguma parte
da minha vida
nasce do outro lado
que esse corpo
desconhece

LÍQUIDO E VERMELHO

nunca mais cuspi sangue
porque não há mais sangue
a ser cuspido
o que corre
em minhas veias
são os gritos
dos meus sonhos
derretidos

O PASSADO

 O OP OPA OPAS OPASS OPASSA OPASSAD OPASSADO O PASSADO OPASSADO PASSADO ASSADO SSADO SADO ADO DO O