moças brancas despencam
do sol
como axilas
eu murmurado por alguma boca
palavra que não alcança
ser ouvida
invento mares de fenos
espero dentes ruminantes
masco o mundo desamparado
destempero mais que a vontade
furos que embriagam furos
provocam os muros
e seus espasmos
sexta-feira, 28 de dezembro de 2012
quarta-feira, 26 de dezembro de 2012
INQUIETAÇÃO
a inquietação sob a pele
quase osso
mantenho-me calmo
quase morto
acendo claridades ao longe
meu corpo o pavio
a inquietação soube
ser um nervo quase exposto
agora cor sobre a pele
musgo ou lágrima do sol
quase osso
mantenho-me calmo
quase morto
acendo claridades ao longe
meu corpo o pavio
a inquietação soube
ser um nervo quase exposto
agora cor sobre a pele
musgo ou lágrima do sol
ESQUECIMENTO
gostaria de lembrar
relacionar a lembrança
a algo acontecido
uma música
um fragmento de poema
um romance
gostaria de lembrar
algo que lembrasse o acontecido
um gesto
um cheiro
o barulho de um rio
gostaria de lembrar
algo aconteceu
e não consigo relacionar
com nenhuma outra lembrança
gostaria de lembrar
relacionar a lembrança
a algo acontecido
uma música
um fragmento de poema
um romance
gostaria de lembrar
algo que lembrasse o acontecido
um gesto
um cheiro
o barulho de um rio
gostaria de lembrar
algo aconteceu
e não consigo relacionar
com nenhuma outra lembrança
gostaria de lembrar
ORBITAL
meu coração voltou
estava em órbita
aprendendo estrelas e destinos
espero que o meu sangue o aceite
e consiga circular
mesmo sem entender brilhar
estava em órbita
aprendendo estrelas e destinos
espero que o meu sangue o aceite
e consiga circular
mesmo sem entender brilhar
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
ANATOMIA DO NADA
diante da disposição
dos corpos sobre a mesa
conclui-se as perdas
lembrei de mim de ti
dos telhados de ardósia
e do modo como as flores amarelam
lembrei de retirar o meu corpo
antes da distração da sorte
o não dizer usando o corpo
a palavra inerte em cada fala
lembrei
nem lembro se lembrei
ou criei tudo isso
dos corpos sobre a mesa
conclui-se as perdas
lembrei de mim de ti
dos telhados de ardósia
e do modo como as flores amarelam
lembrei de retirar o meu corpo
antes da distração da sorte
o não dizer usando o corpo
a palavra inerte em cada fala
lembrei
nem lembro se lembrei
ou criei tudo isso
quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
ENQUANTO O MUNDO NÃO ME ACABA
começo pelo fim
porque é o melhor começo
o fim justifica o medo
e tudo que estiver relacionado
a vida e seus fantasmas
meu modo de mastigar e as fontes
tudo é menor enquanto caminho
tudo cresce quando espero
o intervalo entre um passo e outro
essa quase queda
torna a minha espera eterna
quem sabe o que virá minta
quem não sabe minta de qualquer maneira
a verdade com o tempo
porque é o melhor começo
o fim justifica o medo
e tudo que estiver relacionado
a vida e seus fantasmas
meu modo de mastigar e as fontes
tudo é menor enquanto caminho
tudo cresce quando espero
o intervalo entre um passo e outro
essa quase queda
torna a minha espera eterna
quem sabe o que virá minta
quem não sabe minta de qualquer maneira
a verdade com o tempo
não clareia
LENÇOL
pendurado ao lençol
a lua pendurada no azul
os sonhos fragmentados no chão
flutuo porque não vejo
uso as mão como leme
eu sei qual a minha distância
entre o lençol e o azul
são essas palavras
a lua pendurada no azul
os sonhos fragmentados no chão
flutuo porque não vejo
uso as mão como leme
eu sei qual a minha distância
entre o lençol e o azul
são essas palavras
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
terça-feira, 18 de dezembro de 2012
QUEDAS AGUDAS
já desmaiei com paredes
e desmaiei sem paredes
assim como o tijolo entende o cimento
a pele entende o osso
assim como a flor estende a primavera
o sol estende esferas
prefiro continuar meus desmaios
com paredes ou sem
apresento ao chão meu corpo
da maneira mais aguda
e desmaiei sem paredes
assim como o tijolo entende o cimento
a pele entende o osso
assim como a flor estende a primavera
o sol estende esferas
prefiro continuar meus desmaios
com paredes ou sem
apresento ao chão meu corpo
da maneira mais aguda
segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
ALGUMA COISA
estou sentindo alguma coisa
mas não sei o que é
é bom saber
que estou sentindo alguma coisa
mas não é bom não saber o que é
talvez um sentimento
que eu nunca tenha sentido
ou algum antigo
que eu tenha esquecido
talvez nem seja um sentimento
estou pensando que estou sentindo
e seja só pensamento
talvez eu não sinta a diferença
entre sentir e pensar
e eu esteja sentindo exatamente isso
essa diferença
e a esteja confundindo
com algum sentimento sem sentido
talvez eu nem esteja sentindo nada
só queira fazer
esse amontoado de palavras
mas não sei o que é
é bom saber
que estou sentindo alguma coisa
mas não é bom não saber o que é
talvez um sentimento
que eu nunca tenha sentido
ou algum antigo
que eu tenha esquecido
talvez nem seja um sentimento
estou pensando que estou sentindo
e seja só pensamento
talvez eu não sinta a diferença
entre sentir e pensar
e eu esteja sentindo exatamente isso
essa diferença
e a esteja confundindo
com algum sentimento sem sentido
talvez eu nem esteja sentindo nada
só queira fazer
esse amontoado de palavras
sexta-feira, 14 de dezembro de 2012
TRÉGUA
dou-me uma trégua
e esqueço meu corpo na trincheira
misturado à lama
onde ninguém possa vê-lo
mas que possa ser pisado
pelos outros soldados
e depois de mastigado pelos coturnos
e embebido pelos gritos
possa retornar ao princípio
e encontrar em si mesmo o inimigo
e esqueço meu corpo na trincheira
misturado à lama
onde ninguém possa vê-lo
mas que possa ser pisado
pelos outros soldados
e depois de mastigado pelos coturnos
e embebido pelos gritos
possa retornar ao princípio
e encontrar em si mesmo o inimigo
quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
OUTRO CAMINHO
existe um caminho mais curto
mas eu não quero
quero o passo gasto
o tempo gasto
a possibilidade do encontro
com o infinito
mas eu não quero
quero o passo gasto
o tempo gasto
a possibilidade do encontro
com o infinito
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
PRAÇA DE SÃO PETERSBURGO
sobretudo de modo inexplicável
o ócio da estátua lembrou-me a tua presença
a estátua e seus ossos
espreguiçando a praça entre meus olhos
as folhas dormidas entre os passos e as falhas
acontecidas durante o inverno
parecia dezembro
no entanto eu respirava algo parecido com o fim
o ócio da estátua lembrou-me a tua presença
a estátua e seus ossos
espreguiçando a praça entre meus olhos
as folhas dormidas entre os passos e as falhas
acontecidas durante o inverno
parecia dezembro
no entanto eu respirava algo parecido com o fim
segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
quinta-feira, 6 de dezembro de 2012
A POESIA NÃO ESTÁ EM TODA PARTE
para que lado do mundo
devo me mostrar
nem a poesia sabe
qual lado da poesia
devo mostrar ao mundo
o que cabe
devo me mostrar
nem a poesia sabe
qual lado da poesia
devo mostrar ao mundo
o que cabe
terça-feira, 4 de dezembro de 2012
ELIPSES E ECLIPSES
a poesia é elíptica
assim como os cães enfileirados
cagam diante da prisão
sem noção de onde estão
a poesia é eclíptica
assim como a tarde
esconde o que ninguém sabe
a tarde sabe bem que a poesia
não faz bem nenhum
e toda essa conversa é ultrapassada
essa de estabelecer a poesia elíptica ou eclíptica
tudo é conversa de quem não tem o que dizer
assim como os cães enfileirados
cagam diante da prisão
sem noção de onde estão
a poesia é eclíptica
assim como a tarde
esconde o que ninguém sabe
a tarde sabe bem que a poesia
não faz bem nenhum
e toda essa conversa é ultrapassada
essa de estabelecer a poesia elíptica ou eclíptica
tudo é conversa de quem não tem o que dizer
NATUREZA MORTA
quem carrega o mar entre os ossos
mira com areia em terreno raso
quem tem a alma mais larga que deus
sabe onde o mundo se acaba
meu coração se debate entre o sal e o céu
perdido entre as folhagens
confundido com nuvens
mastigadas por colhedores de frutas
ou confundido com um nervo exposto
a algum olhar maternal
mira com areia em terreno raso
quem tem a alma mais larga que deus
sabe onde o mundo se acaba
meu coração se debate entre o sal e o céu
perdido entre as folhagens
confundido com nuvens
mastigadas por colhedores de frutas
ou confundido com um nervo exposto
a algum olhar maternal
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
ESTAÇÕES
um verão não dura a vida inteira
mas o terno do inverno
foi costurado com a minha pele
dizem que é mais profundo
cuspir o outono
ou mostrar seus dentes
entre as salivas
mas os dentes estão pendurados
entre as pétalas inacabadas
isso não faria nenhuma primavera sorrir
desnecessário supor que as cores
vão se entregar sem algo em troca
uma escuridão do tamanho do agora
ou uma claridade sonora
tanto traz coragens e derrotas
pouco restou de mim antes dos fatos
trapos e ossos contorcidos entre os trilhos
feitos com meus nervos e meus gritos
antes de pousar nas estações
corto o céu como um deserto
sem fazer sangue sem fazer dores
apenas amenas cicatrizes
mas o terno do inverno
foi costurado com a minha pele
dizem que é mais profundo
cuspir o outono
ou mostrar seus dentes
entre as salivas
mas os dentes estão pendurados
entre as pétalas inacabadas
isso não faria nenhuma primavera sorrir
desnecessário supor que as cores
vão se entregar sem algo em troca
uma escuridão do tamanho do agora
ou uma claridade sonora
tanto traz coragens e derrotas
pouco restou de mim antes dos fatos
trapos e ossos contorcidos entre os trilhos
feitos com meus nervos e meus gritos
antes de pousar nas estações
corto o céu como um deserto
sem fazer sangue sem fazer dores
apenas amenas cicatrizes
UM DIA
eu queria um dia
não é bem isso o que eu queria
eu queria um dia
no meio de um pesadelo
assim o grito de permeio
apagaria o dia
e ele seria apenas
a lembrança de
algum medo
não é bem isso o que eu queria
eu queria um dia
no meio de um pesadelo
assim o grito de permeio
apagaria o dia
e ele seria apenas
a lembrança de
algum medo
sexta-feira, 23 de novembro de 2012
RITUAIS
cumprir o ritual
de organizar palavras
até formar sentido
sob algum olhar desconhecido
saber o quanto tudo isso
é ridículo
como o ritual
de vendar os olhos
e se postar diante do espelho
de organizar palavras
até formar sentido
sob algum olhar desconhecido
saber o quanto tudo isso
é ridículo
como o ritual
de vendar os olhos
e se postar diante do espelho
quarta-feira, 21 de novembro de 2012
DROMEDÁRIO
percorreu todo o caminho
sem utilizar os pés
ou utilizar as asas
nem percebeu
os fragmentos da felicidade
espalhados pelo caminho
nem percebeu
quando tudo começou
e agora que chegou
finalmente descobriu
que não existe um fim
sem utilizar os pés
ou utilizar as asas
nem percebeu
os fragmentos da felicidade
espalhados pelo caminho
nem percebeu
quando tudo começou
e agora que chegou
finalmente descobriu
que não existe um fim
SEM SANGUE
eu pensava
que todos os meses
eram sangrentos
mais sangrentos que os meses
são os dias
e mais sangrentos que os dias
são as horas
a flor rosa
que nos roça
é puro sangue disperso
a água clara
que nos afaga
é puro sangue em verso
que todos os meses
eram sangrentos
mais sangrentos que os meses
são os dias
e mais sangrentos que os dias
são as horas
a flor rosa
que nos roça
é puro sangue disperso
a água clara
que nos afaga
é puro sangue em verso
terça-feira, 20 de novembro de 2012
O MELHOR AMIGO
assim como os cães
as palavras morrem
antes de nós
eu queria ter um cão
que não questionasse
o meu tamanho
nem a necessidade
de viver sem sonhos
eu queria um cão
para me abandonar
em algum lugar
onde não houvesse razão
para ficar
as palavras morrem
antes de nós
eu queria ter um cão
que não questionasse
o meu tamanho
nem a necessidade
de viver sem sonhos
eu queria um cão
para me abandonar
em algum lugar
onde não houvesse razão
para ficar
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
VÃOS
a porta que se foi
e deixou esse vão
o lado de fora
não sei agora
entrar ou sair
são verbos estranhos
meu corpo se apresenta
cumpre o ritual
faz do vão
a porta principal
e deixou esse vão
o lado de fora
não sei agora
entrar ou sair
são verbos estranhos
meu corpo se apresenta
cumpre o ritual
faz do vão
a porta principal
SEM SENTIDOS
perdi os sentidos
em alguma gaveta
doce mastigar das baratas
entre os sisos meu tato
meu paladar descobre heterônimos
minha audição adiada
minha visão do mundo
apagada como uma encosta
encolhida pela chuva
em alguma gaveta
doce mastigar das baratas
entre os sisos meu tato
meu paladar descobre heterônimos
minha audição adiada
minha visão do mundo
apagada como uma encosta
encolhida pela chuva
ESTRELAS ARDENTES
o ardor das estrelas
não se pode acender
toda essa cor
explosões com caminhos
de ida e volta
quem tem aonde chegar
sabe que não existe
a melhor hora de voltar
saber que existe o lugar
essa é a melhor hora
não se pode acender
toda essa cor
explosões com caminhos
de ida e volta
quem tem aonde chegar
sabe que não existe
a melhor hora de voltar
saber que existe o lugar
essa é a melhor hora
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
AXIOMA
descrença
pequena intervenção de deus
na existência
existo porque a palavra existe
inexisto após a palavra
uso o silêncio como um sintoma
todas as palavras que crio
serão entendidas em qualquer idioma
a palavra é um deus
que tem como oração um axioma
pequena intervenção de deus
na existência
existo porque a palavra existe
inexisto após a palavra
uso o silêncio como um sintoma
todas as palavras que crio
serão entendidas em qualquer idioma
a palavra é um deus
que tem como oração um axioma
COMO FACA
uso a folha de papel como faca
o que parece sangue são palavras
o que parece dor é o silêncio
o que parece sangue são palavras
o que parece dor é o silêncio
segunda-feira, 12 de novembro de 2012
ENTRE AS MINHAS PERNAS
observo o homem
entre as minhas pernas
melhor dizendo
observo a cabeça do homem
entre as minhas pernas
o pior é que ele nem sabe
que já é um homem
mas comporta-se como tal
com essa cabeça
entre as minhas pernas
empurrando minha carne
rasgando a minha pele
vertendo o meu sangue
esse homem que ainda
nem sabe que é um homem
esse homem que expulso
do meu ventre para o mundo
contra a sua vontade
antes da hora prevista
esse homem natimorto
entre as minhas pernas
troco suas trevas internas
por trevas eternas
o filho que parte
a minha pele
parte para outra parte
melhor que aqui dentro
MAÍRA PINHEIRO
San Francisco, 1978
entre as minhas pernas
melhor dizendo
observo a cabeça do homem
entre as minhas pernas
o pior é que ele nem sabe
que já é um homem
mas comporta-se como tal
com essa cabeça
entre as minhas pernas
empurrando minha carne
rasgando a minha pele
vertendo o meu sangue
esse homem que ainda
nem sabe que é um homem
esse homem que expulso
do meu ventre para o mundo
contra a sua vontade
antes da hora prevista
esse homem natimorto
entre as minhas pernas
troco suas trevas internas
por trevas eternas
o filho que parte
a minha pele
parte para outra parte
melhor que aqui dentro
MAÍRA PINHEIRO
San Francisco, 1978
quinta-feira, 8 de novembro de 2012
POEMA LONGO
queria alongar este poema
até onde a vista cederia
cedeu meu mundo
e tudo que nele cabia
até onde a vista cederia
cedeu meu mundo
e tudo que nele cabia
PARA NÃO ME FAZER
se fosse de pedra
eu me jogaria
em tua vidraça
sou de pássaro
passo meu canto
entre os vidros
eu me jogaria
em tua vidraça
sou de pássaro
passo meu canto
entre os vidros
HÁ MAR
brinco de azul
entre os cinzas
confundem-me com o céu
não sentem minhas ondas
devasto os cinzas
como se suspenso estivesse
espalho o meu sal
entre os cinzas
confundem-me com o céu
não sentem minhas ondas
devasto os cinzas
como se suspenso estivesse
espalho o meu sal
COTIDIÁRIO
vamos começar tudo de novo
fazer as mesmas coisas
ver as mesmas pessoas
talvez os mesmos gestos
talvez as mesmas palavras
a sola gasta do tempo
deixa os pingos das horas
quebrar o silêncio da nossa paciência
certo dia
nós vamos querer recomeçar
e não vamos conseguir
tudo ficará parado
desconheço de como seria a rotina
sem estar desse lado
se é que a morte é de fato
o outro lado
fazer as mesmas coisas
ver as mesmas pessoas
talvez os mesmos gestos
talvez as mesmas palavras
a sola gasta do tempo
deixa os pingos das horas
quebrar o silêncio da nossa paciência
certo dia
nós vamos querer recomeçar
e não vamos conseguir
tudo ficará parado
desconheço de como seria a rotina
sem estar desse lado
se é que a morte é de fato
o outro lado
quarta-feira, 7 de novembro de 2012
POEMA PARA SER QUEIMADO
vejo que chegou até aqui
parabéns
muitos chegaram aqui já mortos
outros cegos
outros surdos
e você está aqui
em frente ao poema
e espera ouvir de mim
algum sentimento
ou algum ensinamento
sinto decepcioná-lo
tolo quem espera isso
de algum poema
acredite que os mortos
ganharam mais por não chegarem até aqui
talvez os cegos talvez os surdos
também tenham ganhado mais
o que posso aconselhar
é que você abandone esse poema
agora
prometo que vou queimá-lo
talvez as chamas atinjam os seus olhos
não olhe para trás
parabéns
muitos chegaram aqui já mortos
outros cegos
outros surdos
e você está aqui
em frente ao poema
e espera ouvir de mim
algum sentimento
ou algum ensinamento
sinto decepcioná-lo
tolo quem espera isso
de algum poema
acredite que os mortos
ganharam mais por não chegarem até aqui
talvez os cegos talvez os surdos
também tenham ganhado mais
o que posso aconselhar
é que você abandone esse poema
agora
prometo que vou queimá-lo
talvez as chamas atinjam os seus olhos
não olhe para trás
terça-feira, 6 de novembro de 2012
CORRENTEZA DE PEDRA
as árvores descem
mais rápidas que o rio
suas águas verdes
mais parecem de pedra
quando eu entender
a correnteza
talvez também me entenda
as cicatrizes que absorvem
o rio que vem depois
CANTO RECOLHIDO
encolhido no canto
do pássaro recolhido
sob a sombra
um canto de vento
pendurado na nuvem
do tamanho
que a sombra permite
entre o chão e o grito
entre o não e o que digo
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
APARELHO DA TARDE
o sol desceu
com os pés
atolados na chuva
a sombra
sob a água
os dedos esquecidos
dentro de
um aparelho
parecido com
a tarde
que tremeu
e quem não temeria
com os pés
atolados na chuva
a sombra
sob a água
os dedos esquecidos
dentro de
um aparelho
parecido com
a tarde
que tremeu
e quem não temeria
BELEZA
no começo era lindo
o caminho de flores
o chão engomado pela sombra
o cheiro tornando os poros
mais fortes que a memória
tudo muito lindo angustia
até a beleza precisa de descanso
a feiura da dor
circulando pela pele
como se o sangue exalasse
o perfume do mundo
o caminho de flores
o chão engomado pela sombra
o cheiro tornando os poros
mais fortes que a memória
tudo muito lindo angustia
até a beleza precisa de descanso
a feiura da dor
circulando pela pele
como se o sangue exalasse
o perfume do mundo
CADERNO
enriqueço meu caderno em branco
com o meu silêncio
o que eu disser
não vai tirar o peso dos meus ombros
ou retirar o peso do teu
enriqueço o meu caderno em branco
mergulhando-o nas chamas
as cinzas do silêncio
flutuam no ar como desenhos
repousam no não
formando esse poema
com o meu silêncio
o que eu disser
não vai tirar o peso dos meus ombros
ou retirar o peso do teu
enriqueço o meu caderno em branco
mergulhando-o nas chamas
as cinzas do silêncio
flutuam no ar como desenhos
repousam no não
formando esse poema
DIA DOS VIVOS
não sei onde enterrei
o meu cadáver
espero nunca mais encontrá-lo
se por acaso alguém o encontrar
finja-se de morto
não respondo pelo que
o meu cadáver possa fazer
não aconselho removê-lo
ou enterrá-lo novamente
deixe-o imóvel
talvez eu tenha sorte
e sinta cócegas
durante a autópsia
o meu cadáver
espero nunca mais encontrá-lo
se por acaso alguém o encontrar
finja-se de morto
não respondo pelo que
o meu cadáver possa fazer
não aconselho removê-lo
ou enterrá-lo novamente
deixe-o imóvel
talvez eu tenha sorte
e sinta cócegas
durante a autópsia
terça-feira, 30 de outubro de 2012
CORAGEM
não podendo tomar
algo mais forte
resolveu tomar coragem
o gole seco
irrompeu os caminhos
explodiu em luzes
tanta claridade
vomitaria o sol
se houvesse boca
escalaria o dia
se houvesse unhas
tão calmas estrelas
quase um céu apagado
não se mostrasse a escuridão
seria esquecida
algo mais forte
resolveu tomar coragem
o gole seco
irrompeu os caminhos
explodiu em luzes
tanta claridade
vomitaria o sol
se houvesse boca
escalaria o dia
se houvesse unhas
tão calmas estrelas
quase um céu apagado
não se mostrasse a escuridão
seria esquecida
sexta-feira, 26 de outubro de 2012
DIVIDA
devo
devo o nervo
até o caroço
devo um troço
devo ir
devo um almoço
devo ser moço
devo
devo ser rico
devo ser podre
devo
ter sangue nobre
devo
aos fios cobre
aos rios molhe
azias esnobes
devo
devo algum negócio
devo ócio
até o pescoço
devo ter vida
devo ter divida
devo ter dúvida
até de quem duvida
devo
não prego
caibo
quando me der
devo o nervo
até o caroço
devo um troço
devo ir
devo um almoço
devo ser moço
devo
devo ser rico
devo ser podre
devo
ter sangue nobre
devo
aos fios cobre
aos rios molhe
azias esnobes
devo
devo algum negócio
devo ócio
até o pescoço
devo ter vida
devo ter divida
devo ter dúvida
até de quem duvida
devo
não prego
caibo
quando me der
quinta-feira, 25 de outubro de 2012
HORIZONTAL
sempre acordo melhor
do que dormi
todos os dias
desperto melhor
assim tudo
fica mais fácil
suportar o peso
da terra
sobre o corpo
do que dormi
todos os dias
desperto melhor
assim tudo
fica mais fácil
suportar o peso
da terra
sobre o corpo
COMEÇOU A POESIA
a poesia começou
quem quiser flores
procure o florista
quem quiser cores
procure o analista
quem quiser amores
procure alguém propenso ao fracasso
restou o poeta
e a página em branco
limitada às palavras
quem quiser flores
procure o florista
quem quiser cores
procure o analista
quem quiser amores
procure alguém propenso ao fracasso
restou o poeta
e a página em branco
limitada às palavras
quarta-feira, 24 de outubro de 2012
DO TAMANHO DA ÁGUA
um anjo
acende as asas
e queima a
paisagem ao redor
e eu
que provocava
incêndios aqui na terra
me sinto pequeno
libero
minhas águas
acende as asas
e queima a
paisagem ao redor
e eu
que provocava
incêndios aqui na terra
me sinto pequeno
libero
minhas águas
terça-feira, 23 de outubro de 2012
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
SUPERFÍCIE
choro submerso
confundem meu corpo com o lago
largo
procuro me tornar
o mais próximo do oceano
pareço claro
padeço
são de ares meus passos
desconheço
minhas pegadas
se eu não morrer
nunca entenderei porque existem
se eu não escorrer
nunca entenderei a superfície
confundem meu corpo com o lago
largo
procuro me tornar
o mais próximo do oceano
pareço claro
padeço
são de ares meus passos
desconheço
minhas pegadas
se eu não morrer
nunca entenderei porque existem
se eu não escorrer
nunca entenderei a superfície
IDIOMA
quem leu minha mão
no original
entende o idioma
dos meus gestos
língua rara
de sabor estranho
penetra seca o silêncio
como se tivesse tamanho
no original
entende o idioma
dos meus gestos
língua rara
de sabor estranho
penetra seca o silêncio
como se tivesse tamanho
domingo, 21 de outubro de 2012
MURO
a lucidez
murou meu sonho
eu seria uma paisagem
ou um personagem
de algo
com final desconhecido
mesmo nulo
falo gesticulo
por dentro
do muro de vidro
murou meu sonho
eu seria uma paisagem
ou um personagem
de algo
com final desconhecido
mesmo nulo
falo gesticulo
por dentro
do muro de vidro
sexta-feira, 19 de outubro de 2012
BIGORNA
um artista
nunca se esgota
mesmo esmagado
sobre a bigorna
sua cabeça em chamas
acaricia a cabeça
do martelo
nunca se esgota
mesmo esmagado
sobre a bigorna
sua cabeça em chamas
acaricia a cabeça
do martelo
PARECE FÁCIL
viver
parece fácil
principalmente para o morto
permanece imóvel
com sua respiração presa
a lágrima presa
a vida presa
entre a madeira e as fotos
o espirro preso
pelos odores
das coroas de flores
parece fácil
principalmente para o morto
permanece imóvel
com sua respiração presa
a lágrima presa
a vida presa
entre a madeira e as fotos
o espirro preso
pelos odores
das coroas de flores
ANTES DO CANTO
existir
antes do canto
desse modo
a poesia nos desabilita
pensamos extrapolar o mundo
no entanto
nada fica
antes do canto
desse modo
a poesia nos desabilita
pensamos extrapolar o mundo
no entanto
nada fica
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
DERIVADAS
já visitei lugares
mais quentes que o inferno
já fui solução de várias derivadas
beijei milhares de sapos
e não encontrei o meu príncipe
meu desespero é mais curto
que os meus cabelos
quase na altura dos meus olhos
quando nos encaramos
descubro o meu
verdadeiro tamanho
mais quentes que o inferno
já fui solução de várias derivadas
beijei milhares de sapos
e não encontrei o meu príncipe
meu desespero é mais curto
que os meus cabelos
quase na altura dos meus olhos
quando nos encaramos
descubro o meu
verdadeiro tamanho
terça-feira, 16 de outubro de 2012
EROSÃO
o mar tornou-se o que queria
quem ver o azul não sabe o sal
quem sabe o sal não sente azul
límpido de salgar
liquido de sedar
por onde correm os círculos
o barulho do mar faz estragos
quem ver o azul não sabe o sal
quem sabe o sal não sente azul
límpido de salgar
liquido de sedar
por onde correm os círculos
o barulho do mar faz estragos
DISFARCES
estranhas meus ossos
parecem feitos de plástico defumado
parecem fetos
contorcidos de afetos
parecem fatos
antes de acontecidos
parecem sonhos
antes de adormecidos
cavernoso corpo intumescido
jorra indícios de sorrisos na face
empresto minha pele aos disfarces
quem não me sabe
engole tudo que não cabe
parecem feitos de plástico defumado
parecem fetos
contorcidos de afetos
parecem fatos
antes de acontecidos
parecem sonhos
antes de adormecidos
cavernoso corpo intumescido
jorra indícios de sorrisos na face
empresto minha pele aos disfarces
quem não me sabe
engole tudo que não cabe
quinta-feira, 11 de outubro de 2012
CORAÇÃO
espero que o meu coração
pare
no local exato
de enxergar tudo
espero que o meu coração
me veja
pare
no local exato
de enxergar tudo
espero que o meu coração
me veja
ESPAÇO
há pouco espaço
entre um poema
e um abraço
caberia a poesia
se ela soubesse
que não se sujaria
PUREZA
porque é um diamante
não quer dizer
que entenda de pureza
mesmo as flores de pedra
produzem sombras
não quer dizer
que entenda de pureza
mesmo as flores de pedra
produzem sombras
QUASE UM MADRIGAL
as flores que não alcanço
amassam o meu olhar
esse líquido sonoro
afeta a minha escolha
parece uma dança
caminhar entre as árvores
mesmo que elas pisem
constantemente em meus pés
não perco os passos
e os penduro em cada galho
na esperança que algum dia amadureçam
amassam o meu olhar
esse líquido sonoro
afeta a minha escolha
parece uma dança
caminhar entre as árvores
mesmo que elas pisem
constantemente em meus pés
não perco os passos
e os penduro em cada galho
na esperança que algum dia amadureçam
terça-feira, 9 de outubro de 2012
BOCA VAZIA
nada cruza
o céu da minha boca
nem a minha fala
cuspo as estrelas
evito comê-las
sem que o céu caiba
o céu da minha boca
nem a minha fala
cuspo as estrelas
evito comê-las
sem que o céu caiba
segunda-feira, 8 de outubro de 2012
DESVÃOS
o dinheiro corre
nas artérias da cidade
os pulmões das árvores
as que se sabem
sustentam o pó dos escapes
surge eventualmente
algum homem que logo some
entre a alcova e a cova
RÉCITA
começa a recitar
como se a poesia
fosse feita para acalmar
enquanto isso
a alma transborda lá fora
e com o silêncio
o que fazer agora?
como se a poesia
fosse feita para acalmar
enquanto isso
a alma transborda lá fora
e com o silêncio
o que fazer agora?
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
MORDIDOS
quem se esmaga
sabe o que os dentes mordem
quem sabe dos dentes depois do sorrir
sabe por que se morre
quem sabe o que vale
nunca vale o que move
ultrapassa o espaço do fim
e no fim se comove
sabe o que os dentes mordem
quem sabe dos dentes depois do sorrir
sabe por que se morre
quem sabe o que vale
nunca vale o que move
ultrapassa o espaço do fim
e no fim se comove
VERDADE
eu deveria ter escolhido a verdade
assim morreria mais cedo
esse meu medo
de a mentira prolongar meu destino
tornou minha palavra segredo
a mentira deveria ter me escolhido
assim viveria sem medo
esse meu modo
de prolongar meus caminhos
interrompeu minha vida mais cedo
assim morreria mais cedo
esse meu medo
de a mentira prolongar meu destino
tornou minha palavra segredo
a mentira deveria ter me escolhido
assim viveria sem medo
esse meu modo
de prolongar meus caminhos
interrompeu minha vida mais cedo
quinta-feira, 4 de outubro de 2012
PARIS
a lua paira sobre a torre
como uma auréola
pulo do concorde
e chego antes
cada osso do meu corpo
um monumento
cada monumento
um osso do tempo
as nuvens do meu corpo
não estranham
as teias que se formam
no futuro da entranha
como uma auréola
pulo do concorde
e chego antes
cada osso do meu corpo
um monumento
cada monumento
um osso do tempo
as nuvens do meu corpo
não estranham
as teias que se formam
no futuro da entranha
RAJADA
enquanto eu falava
sobre as folhas
que cobriam o lago
o vento foi mais rápido
e afogou o lago
sobre as folhas
que cobriam o lago
o vento foi mais rápido
e afogou o lago
PERGUNTAS
não me pergunte
talvez eu responda
e a resposta esconda
a verdadeira pergunta
não me pergunte
talvez eu não saiba
a melhor resposta
não me pergunte
a resposta certa
pode não ser
a mais correta
talvez eu responda
e a resposta esconda
a verdadeira pergunta
não me pergunte
talvez eu não saiba
a melhor resposta
não me pergunte
a resposta certa
pode não ser
a mais correta
SOB O TÉDIO
durante o inverno
chove mais
sob o meu tédio
enquanto me enxugo
por mais que remeta
minha cabeça
contra o muro
tudo permanece escuro
por mais que eu não mereça
a vida se esvai
mesmo sem furo
chove mais
sob o meu tédio
enquanto me enxugo
por mais que remeta
minha cabeça
contra o muro
tudo permanece escuro
por mais que eu não mereça
a vida se esvai
mesmo sem furo
segunda-feira, 1 de outubro de 2012
POEMA DE G.VIEIRA
TEU PRESENTE
no teu aniversário
se guarde no armário
num frasco de perfume
se esconda e suma
pra que o tempo chegue
e não te ache e assim passe
sem ver os disfarces
que ocultas na face
da criança que embalas
pra teu presente
no teu aniversário
se guarde no armário
num frasco de perfume
se esconda e suma
pra que o tempo chegue
e não te ache e assim passe
sem ver os disfarces
que ocultas na face
da criança que embalas
pra teu presente
sexta-feira, 28 de setembro de 2012
CHUVA NO AQUÁRIO
enquanto nada se resolve
alguns vestem janelas
olhos e paisagens se misturam
aos automóveis pessoas e plantas
a vida mostraria a cara
caso possuísse
no entanto
permance impassível
assistindo a chuva
inundar o aquário
alguns vestem janelas
olhos e paisagens se misturam
aos automóveis pessoas e plantas
a vida mostraria a cara
caso possuísse
no entanto
permance impassível
assistindo a chuva
inundar o aquário
ÁGUA FORTE
as marcas da chuva
vão desaparecer
poucos conseguem
evaporar junto com a água
eu fui um deles
vão desaparecer
poucos conseguem
evaporar junto com a água
eu fui um deles
sexta-feira, 21 de setembro de 2012
ENTENDIMENTOS
alguns escrevem poemas para sonhar
outros escrevem poemas para viver
os poemas me escrevem?
ou escrevo poemas?
eu me pergunto enquanto os elaboro
mais fácil vive o tempo que se perde
sem precisar se entender
outros escrevem poemas para viver
os poemas me escrevem?
ou escrevo poemas?
eu me pergunto enquanto os elaboro
mais fácil vive o tempo que se perde
sem precisar se entender
QUE CAI DO MEU OLHO
a água que cai do meu olho
muda a natureza de lado
parecia brincadeira
agora é fato
muda a natureza de lado
parecia brincadeira
agora é fato
sexta-feira, 14 de setembro de 2012
GAIOLA
o passarinho
e suas cores
seu canto e suas dores
seu encanto e sua solidão
dormem no escuro
do estômago
do gavião
e suas cores
seu canto e suas dores
seu encanto e sua solidão
dormem no escuro
do estômago
do gavião
CORRUPIO
a infância gira mais rápido que o mundo
atravessa-se uma bananeira
com risadas certeiras
estripam-se formigas
faz-se intriga
entre um grão de areia e outro
até formar um buraco
lombrigas são dependuradas
até tornarem-se pipas
esconde-se atrás de uma folha
que mais parece uma floresta
o universo cabe na infância
seres de outro planeta
rastejam no muro
até abduzir o sol
e brinca-se de adulto
só de mentirinha
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
QUANDO MAMÃE VEIO ME VISITAR
quando mamãe veio me visitar
não havia mais calendários
percorri todos os 365 dias de maio
como se fosse o primeiro
quando mamãe veio me visitar
não havia desmaios
e a lucidez era o gancho
que fixava o meu corpo entre as nuvens
quando mamãe veio me visitar
não havia mais água
e toda palavra pronunciada
derramava um deserto
quando mamãe veio me visitar
não havia mais alma
e a dor era a película
que me ocultava
quando mamãe veio me visitar
não havia mais tempo
tudo que seria dito
ficou tatuado no pensamento
quando mamãe veio me visitar
não havia mais espaço
corredores e portas
chegaram antes do abraço
não havia mais calendários
percorri todos os 365 dias de maio
como se fosse o primeiro
quando mamãe veio me visitar
não havia desmaios
e a lucidez era o gancho
que fixava o meu corpo entre as nuvens
quando mamãe veio me visitar
não havia mais água
e toda palavra pronunciada
derramava um deserto
quando mamãe veio me visitar
não havia mais alma
e a dor era a película
que me ocultava
quando mamãe veio me visitar
não havia mais tempo
tudo que seria dito
ficou tatuado no pensamento
quando mamãe veio me visitar
não havia mais espaço
corredores e portas
chegaram antes do abraço
segunda-feira, 10 de setembro de 2012
CHEIRO DE ADEUS
peido adeus
como quem arrota
no fim dá no mesmo
depende de quem escuta
sempre encontro silêncios
no meio da luta
nem todo cu tem desmaios
nem todo filho é da puta
como quem arrota
no fim dá no mesmo
depende de quem escuta
sempre encontro silêncios
no meio da luta
nem todo cu tem desmaios
nem todo filho é da puta
NUNCA MAIS
uma flor caída
um poema esquecido
pouco se perde
dois pássaros roçam as asas
durante um pouso
e nunca mais se encontram
um poema esquecido
pouco se perde
dois pássaros roçam as asas
durante um pouso
e nunca mais se encontram
DIA NOITE
o dia embrulha silêncios
que a noite vai engolindo
o dia espalha espasmos
que a noite vai tossindo
ANTES DO DIA
não importa se hoje é segunda-feira
a poesia chega antes do dia
e carrega com ela todos os objetos
que ainda não imaginamos
e o dia não permite
que se tornem realidade
quinta-feira, 6 de setembro de 2012
CARCAÇAS
acordo e enterro
minhas pernas
nas carcaças dos sonhos
os sonhos não me lembram
nem me lembro
se houve algum sonho
quem sabe os sonhos
libertem as minhas pernas
da necessidade de parar
MOTIVO
poupo-me da tristeza
não pensando
por outro lado
se eu pensar na alegria
não vou ficar alegre
pensar na tristeza ou na alegria
me abstenho
eu queria um motivo
para um poema
agora tenho
não pensando
por outro lado
se eu pensar na alegria
não vou ficar alegre
pensar na tristeza ou na alegria
me abstenho
eu queria um motivo
para um poema
agora tenho
terça-feira, 4 de setembro de 2012
PREGO
espero a chuva
como um arrepio
espera a pele
espero a morte
como um prego na parede
espera um quadro
como um arrepio
espera a pele
espero a morte
como um prego na parede
espera um quadro
OLHOS LIMPOS
meus olhos estão limpos
mas não consigo enxergar a tarde
nem sei quando ela começou
ou se vai terminar
algumas tardes nunca começam
outras nunca terminam
quando havia vida
eu sabia
já superei essa fase
toda a sujeira dos meus olhos
foi embora com alguma tarde
que nunca mais voltou
meus olhos estão limpos
e quando estão fechados
inclinam meu corpo
em direção à noite
mas não consigo enxergar a tarde
nem sei quando ela começou
ou se vai terminar
algumas tardes nunca começam
outras nunca terminam
quando havia vida
eu sabia
já superei essa fase
toda a sujeira dos meus olhos
foi embora com alguma tarde
que nunca mais voltou
meus olhos estão limpos
e quando estão fechados
inclinam meu corpo
em direção à noite
REGRESSO
sinto me falta
regresso a mim mesmo
dou em torno de mim
começos
avanço aos pedaços
dou pés aos meus passos
tropeços
regresso a mim mesmo
dou em torno de mim
começos
avanço aos pedaços
dou pés aos meus passos
tropeços
RETIRADA
mais uma vez
retiro as palavras
dos seus locais impróprios
e penso organizá-las
num lugar próprio
e entre esses dois pontos
ocupo mais espaço
do que tempo
retiro-me sem tocá-las
e penso que as abandono
num lugar melhor
sexta-feira, 31 de agosto de 2012
ESTIO
pra mim chega
toda vez é isso
essa página em branco
e esse olho por cima
sem fazer sombra
é só luz é só calor
e nada abaixo se queima
nem esquenta
nem permanece frio
pra mim chega
carregar algo
parecido com um corpo
mas que nunca chega
aonde deveria
porque já está morto
toda vez é isso
essa página em branco
e esse olho por cima
sem fazer sombra
é só luz é só calor
e nada abaixo se queima
nem esquenta
nem permanece frio
pra mim chega
carregar algo
parecido com um corpo
mas que nunca chega
aonde deveria
porque já está morto
terça-feira, 28 de agosto de 2012
quinta-feira, 23 de agosto de 2012
O CORAÇÃO É APENAS UM MÚSCULO
não se preocupe
continue administrando
os ossos sob a tua pele
administre o sangue sob a tua carne
enquanto isso
alguém adestra a tua alma
e o coração é apenas um músculo
que te ensinou a pensar em segredo
continue administrando
os ossos sob a tua pele
administre o sangue sob a tua carne
enquanto isso
alguém adestra a tua alma
e o coração é apenas um músculo
que te ensinou a pensar em segredo
SOBRE A ESCURIDÃO
o amor ultrapassa as pessoas
e se instala ao redor
o amor da porta pelo vão
o amor dos pés pelo chão
o amor da terra pelas formigas
o amor das formigas pelo cadáver
e o amor do cadáver pela escuridão
prolifera as coisas claras
e uma flor sem precisar de músculos
se despetala
e se instala ao redor
o amor da porta pelo vão
o amor dos pés pelo chão
o amor da terra pelas formigas
o amor das formigas pelo cadáver
e o amor do cadáver pela escuridão
prolifera as coisas claras
e uma flor sem precisar de músculos
se despetala
terça-feira, 21 de agosto de 2012
SOMBRA
a certeza de não morrer
abre essa página
tome-a entre as suas mãos
como se uma folha de uma árvore
soubesse que não é mais sombra
abre essa página
tome-a entre as suas mãos
como se uma folha de uma árvore
soubesse que não é mais sombra
OUTRO
não olhes para mim
se estás ai dentro
não fui eu quem te introduziu
nem me perguntes pela saída
se eu soubesse já teria fugido
olhas quando olho
desapareces quando desapareço
querias estar ao meu lado
mas tens medo
no fundo queres me socar
mas socar o meu rosto
só vai provocar a quebra do espelho
se estás ai dentro
não fui eu quem te introduziu
nem me perguntes pela saída
se eu soubesse já teria fugido
olhas quando olho
desapareces quando desapareço
querias estar ao meu lado
mas tens medo
no fundo queres me socar
mas socar o meu rosto
só vai provocar a quebra do espelho
FOTOGRAFIA
sempre me imaginei
como uma fotografia ao fundo
desfocada
quase sem ser enxergada
uma mancha perdida
na paisagem
algo a ser excluído
da arte final
como uma fotografia ao fundo
desfocada
quase sem ser enxergada
uma mancha perdida
na paisagem
algo a ser excluído
da arte final
DEBULHADO
pensei em deixar o tempo
marcar a minha pele
agi antes e me descasquei
o tempo passeia agora
entre uma lasca e outra
evitando minhas águas
marcar a minha pele
agi antes e me descasquei
o tempo passeia agora
entre uma lasca e outra
evitando minhas águas
AUSENTE
e se te mostrarem o quarto vazio
com os pés da cama pendurados pela janela
as roupas enforcadas nas cortinas
os papéis de parede em adiantado
estado de putrefação
e a tua voz permanecer oculta
mesmo envolvida num grito
e o teu gesto chegar depois do gesto
de uma estátua
e o teu pensamento cansado
de tanto preencher paisagens
e o teu corpo guardado
dentro das tuas malas
mesmo assim não entenderás
a tua presença
com os pés da cama pendurados pela janela
as roupas enforcadas nas cortinas
os papéis de parede em adiantado
estado de putrefação
e a tua voz permanecer oculta
mesmo envolvida num grito
e o teu gesto chegar depois do gesto
de uma estátua
e o teu pensamento cansado
de tanto preencher paisagens
e o teu corpo guardado
dentro das tuas malas
mesmo assim não entenderás
a tua presença
ANTES PASSADO
alguém parecido comigo
em algum lugar do passado
mói a angústia
de outro antepassado
eu não converso com a angústia
tenho outras prioridades
meu futuro é estranho
como era para o meu antepassado
mais estranho é o presente
que me coloca de lado
ACENOS
um céu retorcido de arames
protege o sol dos nossos olhos
alavancas turvas abraçam nossas pernas
areia afogada sob o mar
todos esses corpos
com os braços erguidos
acenam como se a despedida
tornasse o azul mais possível
no entanto outras cores
submerge tudo
sexta-feira, 17 de agosto de 2012
RISCO
traço um risco
entre mim e o fim
não entendo de equilíbrios
entendo mais de quedas
tenho o bolso repleto delas
na calça esquecida onde morri
entre mim e o fim
não entendo de equilíbrios
entendo mais de quedas
tenho o bolso repleto delas
na calça esquecida onde morri
quinta-feira, 16 de agosto de 2012
BREVE INTERRUPÇÃO
alguém
que sabe ser feliz
por saber da morte
por saber que as borboletas
pousam sem precisar de sorte
interrompeu essa página
para dizer isso
e mesmo assim
não foi ouvido
que sabe ser feliz
por saber da morte
por saber que as borboletas
pousam sem precisar de sorte
interrompeu essa página
para dizer isso
e mesmo assim
não foi ouvido
VAZIOS
no poema
há temporal
há calmaria
no poema
cabem agonias
almas tardias
procurando corpos
encontrando ossos
armadilhas
no poema
há acidez
há troncos sem raiz
sem abdômen
há peles
procurando nomes
há pelos
há falos
amenos
no poema
ai de quem
tem a certeza
que há
algo num poema
há temporal
há calmaria
no poema
cabem agonias
almas tardias
procurando corpos
encontrando ossos
armadilhas
no poema
há acidez
há troncos sem raiz
sem abdômen
há peles
procurando nomes
há pelos
há falos
amenos
no poema
ai de quem
tem a certeza
que há
algo num poema
segunda-feira, 13 de agosto de 2012
A MELHOR FORMA DE DIZER
sempre assim
buscando coisas
difíceis de dizer
encontrando coisas
fáceis de sentir
e como escrever
sem usar palavras
já usadas
melhor soltá-las
buscando coisas
difíceis de dizer
encontrando coisas
fáceis de sentir
e como escrever
sem usar palavras
já usadas
melhor soltá-las
COMO SE FOSSE ÁGUA
não consigo ficar contido
não consigo me conter
no entanto está tudo entupido
não tenho pra onde correr
se ainda eu pudesse esborrar
se ainda eu soubesse evaporar
mas não consigo
não sei como me desfazer
não sei como fico concreto
não sei como me liquefazer
não consigo me conter
no entanto está tudo entupido
não tenho pra onde correr
se ainda eu pudesse esborrar
se ainda eu soubesse evaporar
mas não consigo
não sei como me desfazer
não sei como fico concreto
não sei como me liquefazer
DÓCIL
meu algoz é dócil
sorriso na ponta da espada
atravessa a minha entranha
reduz à dor física
meu desespero encravado
como se eu pudesse
escolher uma dor
sorriso na ponta da espada
atravessa a minha entranha
reduz à dor física
meu desespero encravado
como se eu pudesse
escolher uma dor
NOME DA CHUVA
diferente das pessoas
toda chuva tem um nome
as pessoas nunca chegam
mesmo quando sabemos os seus nomes
a chuva sempre vem
toda chuva tem um nome
as pessoas nunca chegam
mesmo quando sabemos os seus nomes
a chuva sempre vem
quinta-feira, 9 de agosto de 2012
CRU SE FICO
por falta de cruz
fico pregado na parede
espero alguém vir abrir
as sete chagas
as sete pragas
às sete horas
alguém abrir a porta
por onde eu escorra
essa demora me incomoda
alheia à gravidade
a parede se espreguiça
e me encaminha
em direção ao céu
fico pregado na parede
espero alguém vir abrir
as sete chagas
as sete pragas
às sete horas
alguém abrir a porta
por onde eu escorra
essa demora me incomoda
alheia à gravidade
a parede se espreguiça
e me encaminha
em direção ao céu
quinta-feira, 2 de agosto de 2012
MORTO POR ENQUANTO
a morte é estranha
enfrentei situações terríveis
e sobrevivi
agora morro por um simples fato
dizem que não entendem
algumas coisas que escrevo
nem sempre quem escreve
quer dizer alguma coisa
minha capacidade de reter palavras
está comprometida
mesmo depois da minha morte
as palavras continuarão a crescer
enfrentei situações terríveis
e sobrevivi
agora morro por um simples fato
dizem que não entendem
algumas coisas que escrevo
nem sempre quem escreve
quer dizer alguma coisa
minha capacidade de reter palavras
está comprometida
mesmo depois da minha morte
as palavras continuarão a crescer
COMO EVITAR UMA GUERRA
não transforme seus inimigos
em motivos para a guerra
pois a guerra
inevitavelmente
acarreta a morte de inocentes
por isso antes
que a guerra comece
elimine os inimigos
mas aja depressa
antes que eles tenham
a mesma idéia
em motivos para a guerra
pois a guerra
inevitavelmente
acarreta a morte de inocentes
por isso antes
que a guerra comece
elimine os inimigos
mas aja depressa
antes que eles tenham
a mesma idéia
AS DIFÍCEIS FÁCEIS
alguns preferem as fáceis
porque não querem dificuldades
porque as fáceis estão em toda parte
e qualquer um tem acesso
outros preferem as difíceis
pela própria dificuldade
e ao usá-las e tornar isso público
vai parecer aos outros
que tudo ficou mais fácil
eu prefiro as fáceis
para usá-las de maneira difícil
usar as fáceis de modo fácil
não vai parecer nada difícil
então dificulto o uso fácil
procurando o modo difícil
classificar o que é fácil
ou o que é difícil
também não é uma tarefa fácil
usar por exemplo a palavra fácil
para um poema parecer difícil
é mais fácil escrever difícil de maneira fácil
do que escrever fácil de maneira difícil
senti isso desde o inicio
porque não querem dificuldades
porque as fáceis estão em toda parte
e qualquer um tem acesso
outros preferem as difíceis
pela própria dificuldade
e ao usá-las e tornar isso público
vai parecer aos outros
que tudo ficou mais fácil
eu prefiro as fáceis
para usá-las de maneira difícil
usar as fáceis de modo fácil
não vai parecer nada difícil
então dificulto o uso fácil
procurando o modo difícil
classificar o que é fácil
ou o que é difícil
também não é uma tarefa fácil
usar por exemplo a palavra fácil
para um poema parecer difícil
é mais fácil escrever difícil de maneira fácil
do que escrever fácil de maneira difícil
senti isso desde o inicio
segunda-feira, 30 de julho de 2012
RÓTULO
superar o limite do sonho
e acordar com a vida em punho
usá-la pra recortar
tudo que foi encaixado na noite passada
comer os cacos
engolir os frascos
onde a cabeça estava guardada
e acordar com a vida em punho
usá-la pra recortar
tudo que foi encaixado na noite passada
comer os cacos
engolir os frascos
onde a cabeça estava guardada
PRECIOSAS
lapidar palavras
é para os fracos
dilapidar palavras
é para os francos
ser fraco ou franco
requer incerteza
no meu sincero silêncio
ergo minha fortaleza
é para os fracos
dilapidar palavras
é para os francos
ser fraco ou franco
requer incerteza
no meu sincero silêncio
ergo minha fortaleza
PANCADA DE VENTO
pancadas de vento
empurram os corações
para bem longe
algumas vezes os corpos vão junto
nunca tive essa sorte
meu coração perdeu-se na poeira
e o meu corpo ficou
dando voltas no ar
até ficar gravado aqui
nessa página
quinta-feira, 26 de julho de 2012
MODO DE LEVANTAR
a lua o sol
ou qualquer outro objeto
dependurado lá fora
ou as pessoas que caminham
ou as penduradas em automóveis
ou as que se arrastam e as que flutuam
ou os animais arrastados por coleiras
ou os que pensam que estão soltos
ou as plantas
que aproveitam para pensar
enquanto dormimos
tudo que citei
e todas as outras que não cabem
na minha cabeça ou na tua
nada disso
vai se importar
se tu vais por os pés no chão e caminhar
ou enfiar os pés em algum couro
ou em algo plastificado
ou se vais empurrar tua cadeira de rodas
ou se vais te arrastar sem as pernas
nada disso
ninguém está preocupado
se ainda tens pernas ou braços
ou se estás pensando em algo
ou se o teu cão arrancou
a flor que tens desenhada no teu carro
sugiro que volte a dormir
troque o sonho pelo pesadelo
assim acordarás mais rápido e com medo
e porás os pés no chão
como se fosse um segredo
ou qualquer outro objeto
dependurado lá fora
ou as pessoas que caminham
ou as penduradas em automóveis
ou as que se arrastam e as que flutuam
ou os animais arrastados por coleiras
ou os que pensam que estão soltos
ou as plantas
que aproveitam para pensar
enquanto dormimos
tudo que citei
e todas as outras que não cabem
na minha cabeça ou na tua
nada disso
vai se importar
se tu vais por os pés no chão e caminhar
ou enfiar os pés em algum couro
ou em algo plastificado
ou se vais empurrar tua cadeira de rodas
ou se vais te arrastar sem as pernas
nada disso
ninguém está preocupado
se ainda tens pernas ou braços
ou se estás pensando em algo
ou se o teu cão arrancou
a flor que tens desenhada no teu carro
sugiro que volte a dormir
troque o sonho pelo pesadelo
assim acordarás mais rápido e com medo
e porás os pés no chão
como se fosse um segredo
ONDA SONORA
melhorei minha culpa
meu coração de peruca
passeia disfarçado
entre os cogumelos
pareço chorar
mas a minha alma
por dentro está enxuta
e quem me escuta
há de me dizer
por onde a minha alma anda por dentro
há de saber
que o meu corpo tornou-se
uma onda sonora
de um instrumento
que ainda vão inventar
meu coração de peruca
passeia disfarçado
entre os cogumelos
pareço chorar
mas a minha alma
por dentro está enxuta
e quem me escuta
há de me dizer
por onde a minha alma anda por dentro
há de saber
que o meu corpo tornou-se
uma onda sonora
de um instrumento
que ainda vão inventar
terça-feira, 24 de julho de 2012
CORPO ESTRANHO
eu não conheço aqui
eu não conheço ali
desconheço algum lugar que me reconheça
meu corpo estranho bóia no meu olho
sinto-me um estranho dentro de um olho
uso a paisagem como meu colírio
faço das palavras meu delírio
e permanece lúcido meu olho
eu não conheço ali
desconheço algum lugar que me reconheça
meu corpo estranho bóia no meu olho
sinto-me um estranho dentro de um olho
uso a paisagem como meu colírio
faço das palavras meu delírio
e permanece lúcido meu olho
SANGUE DESCONHECIDO
o sangue quase seco na mão
pegajoso cola os poros
respiro impaciência
um colar de chãos
envolve o meu pescoço
passeiam sobre mim
essas palavras
essas pessoas
o sangue seco na mão
pena que não é o meu
pegajoso cola os poros
respiro impaciência
um colar de chãos
envolve o meu pescoço
passeiam sobre mim
essas palavras
essas pessoas
o sangue seco na mão
pena que não é o meu
PRÍNCIPE ENCANTADO
não mergulhei no lago
em busca de algum sapo
para beijar
mergulhei no lago
porque eu não sabia nadar
e se algum pretendente
enxergar o lago
e no meio do lago
meu braço erguido
será coroado
o meu príncipe encantado
em busca de algum sapo
para beijar
mergulhei no lago
porque eu não sabia nadar
e se algum pretendente
enxergar o lago
e no meio do lago
meu braço erguido
será coroado
o meu príncipe encantado
sexta-feira, 20 de julho de 2012
PARA ENTENDER
às vezes entendo
teus poemas
a maioria das vezes não
os que entendo
são aqueles sem palavras
aqueles desprovidos de página
os que não entendo
também estão sem palavras
mas eles me escrevem no mundo
como se ele fosse uma página
teus poemas
a maioria das vezes não
os que entendo
são aqueles sem palavras
aqueles desprovidos de página
os que não entendo
também estão sem palavras
mas eles me escrevem no mundo
como se ele fosse uma página
AR DE ARADO
frio sem arrepio
o pássaro lambe a manhã
até molhar um canto
poro arejado
porejar o arado
até formar um pranto
fios se emborracham
com pouca eletricidade
nenhuma energia garante
sentir a velocidade
o pássaro lambe a manhã
até molhar um canto
poro arejado
porejar o arado
até formar um pranto
fios se emborracham
com pouca eletricidade
nenhuma energia garante
sentir a velocidade
quinta-feira, 19 de julho de 2012
SENTADO
sentado
sendo olhado pelo
mundo
sendo olhado por mim
pareço perdido
isolado
não disfarço quando me perco
grito para dentro
não escuto
crio muros
e nem me mexo
espero
o momento exato
e me levanto
sendo olhado pelo
mundo
sendo olhado por mim
pareço perdido
isolado
não disfarço quando me perco
grito para dentro
não escuto
crio muros
e nem me mexo
espero
o momento exato
e me levanto
TEMPO QUE ME ENGOLE
o tempo me despela
estranha entranha
que me engole
sem dar goles
lençóis encobrem o céu
em grande escala
são a minha pele
arrancada pelo tempo
entranha imensa
engole minha cabeça
sem pagar a recompensa
estranha entranha
que me engole
sem dar goles
lençóis encobrem o céu
em grande escala
são a minha pele
arrancada pelo tempo
entranha imensa
engole minha cabeça
sem pagar a recompensa
terça-feira, 17 de julho de 2012
DEPOIS QUE O VENTO PASSAR
vai passar
vai passar
esse vento
impertinente
desmanchando a praia
jogando areia nos olhos
vai passar
antes que o sal da água se apague
e a água doce lave os olhos
vai passar
esse vento
sem rodeios
derrubando tudo por dentro
quebrando coisas
difíceis de consertar
e outras impossíveis
mas que permanecerão sempre aqui
depois que o vento passar
vai passar
esse vento
impertinente
desmanchando a praia
jogando areia nos olhos
vai passar
antes que o sal da água se apague
e a água doce lave os olhos
vai passar
esse vento
sem rodeios
derrubando tudo por dentro
quebrando coisas
difíceis de consertar
e outras impossíveis
mas que permanecerão sempre aqui
depois que o vento passar
POR TODO LADO DO CORPO
meu lado esquerdo
envelhece mais rápido
que o meu lado direito
meu coração mais velho
que a minha mão direita
quer tornar a felicidade
uma obrigação de
todos os lados do corpo
a mão esquerda que não pensa
até porque não há razão pra isso
sufoca o coração
até ele entender
que não existe o paraíso
envelhece mais rápido
que o meu lado direito
meu coração mais velho
que a minha mão direita
quer tornar a felicidade
uma obrigação de
todos os lados do corpo
a mão esquerda que não pensa
até porque não há razão pra isso
sufoca o coração
até ele entender
que não existe o paraíso
quinta-feira, 12 de julho de 2012
IDADE DOS BRINQUEDOS
os brinquedos não acompanham
o envelhecimento da infância
objetos virtuais de plástico
submersos no lodo da lembrança
obstruem a passagem
dos adultos afogados na esperança
o envelhecimento da infância
objetos virtuais de plástico
submersos no lodo da lembrança
obstruem a passagem
dos adultos afogados na esperança
SANGUE DE POESIA
o sangue da poesia
sempre é desproporcional à queda
não é arterial nem é venoso
mais epitelial do que venenoso
mais normal que assombroso
o sangue da poesia
não cabe num corpo
talvez numa multidão
se encontrasse algum coração
sempre é desproporcional à queda
não é arterial nem é venoso
mais epitelial do que venenoso
mais normal que assombroso
o sangue da poesia
não cabe num corpo
talvez numa multidão
se encontrasse algum coração
quarta-feira, 11 de julho de 2012
CÉU INTERNO
a noite finge orgasmos
molhando a lua
as nuvens formam palavras
que o céu apaga
o céu azul não é o meu
papel em branco
escrevo planto e arranco
vista do alto
minha cabeça parece solta
sob ela um corpo enrugado
carrega um céu interno
mais inverno que moderno
já passei da idade
de sentar nas nuvens
elas são manchas
espalhadas pelo meu corpo azul
abraçado ao mundo
molhando a lua
as nuvens formam palavras
que o céu apaga
o céu azul não é o meu
papel em branco
escrevo planto e arranco
vista do alto
minha cabeça parece solta
sob ela um corpo enrugado
carrega um céu interno
mais inverno que moderno
já passei da idade
de sentar nas nuvens
elas são manchas
espalhadas pelo meu corpo azul
abraçado ao mundo
sexta-feira, 6 de julho de 2012
IDÉIA
a idéia
espreme a testa
até sair uma cabeça
e ela
entre dois mundos
ou dois dedos
pensará que é medo
o que parece fundo
e encolherá
entre a testa
e o crânio
até vencer
o tamanho
espreme a testa
até sair uma cabeça
e ela
entre dois mundos
ou dois dedos
pensará que é medo
o que parece fundo
e encolherá
entre a testa
e o crânio
até vencer
o tamanho
SEMPRE SERÁ BREVE
não importa o acúmulo das horas
sempre será breve o nosso tempo
nem gravar o som dos momentos
sempre será breve o nosso tempo
não adianta esperar lá fora ou aqui dentro
sempre será breve o nosso tempo
nem expor o nervo à prova
sempre será breve o nosso tempo
acordar o músculo com a espora
sempre será breve o nosso tempo
ancorar o barco no vazio lento
sempre será breve o nosso tempo
ou esperar que um poema resolva o nosso problema
sempre será breve o nosso tempo
sempre será breve o nosso tempo
nem gravar o som dos momentos
sempre será breve o nosso tempo
não adianta esperar lá fora ou aqui dentro
sempre será breve o nosso tempo
nem expor o nervo à prova
sempre será breve o nosso tempo
acordar o músculo com a espora
sempre será breve o nosso tempo
ancorar o barco no vazio lento
sempre será breve o nosso tempo
ou esperar que um poema resolva o nosso problema
sempre será breve o nosso tempo
ADEUS AOS DENTES
penso constantemente
em me livrar dos dentes
pouco tenho sorrido
pouco tenho mordido
e os socos que me atingem
são tão fracos
nem rasgam os lábios
com a boca vazia
sobrará mais espaço
para o grito e
para a poesia
em me livrar dos dentes
pouco tenho sorrido
pouco tenho mordido
e os socos que me atingem
são tão fracos
nem rasgam os lábios
com a boca vazia
sobrará mais espaço
para o grito e
para a poesia
DESENCANTO
ao redor do mundo
é mágico
ainda não
estamos nele
por enquanto
o mundo nos empurra
para o centro
do desencanto
é mágico
ainda não
estamos nele
por enquanto
o mundo nos empurra
para o centro
do desencanto
quarta-feira, 4 de julho de 2012
HEMISFÉRICO
escrevo
costuro a ilusão
com as linhas da minha mão
enrolo a vida que me veste
com a mesma mão
desfaço o gesto
descrevo
preencho vazios
com linhas imaginárias
finco a bandeira
no lado escuro
do globo ocular
a poesia a faz tremular
costuro a ilusão
com as linhas da minha mão
enrolo a vida que me veste
com a mesma mão
desfaço o gesto
descrevo
preencho vazios
com linhas imaginárias
finco a bandeira
no lado escuro
do globo ocular
a poesia a faz tremular
POESIA ENLATADA
ninguém procura
a estante da poesia
é a última do corredor
e para chegar até ela
inúmeras escadas
corredores sem janelas
catracas
e quem consegue alcançá-la
procura a melhor embalagem
dentro do prazo de validade
sem arranhões ou amassos
sem contraindicações ou percalços
espera emoções ao abri-la
nem percebem
que os melhores conteúdos
ficaram espalhados na entrada
a estante da poesia
é a última do corredor
e para chegar até ela
inúmeras escadas
corredores sem janelas
catracas
e quem consegue alcançá-la
procura a melhor embalagem
dentro do prazo de validade
sem arranhões ou amassos
sem contraindicações ou percalços
espera emoções ao abri-la
nem percebem
que os melhores conteúdos
ficaram espalhados na entrada
segunda-feira, 2 de julho de 2012
PREFERÊNCIAS SUICIDAS
um suicida que goza com a morte
só prova isso uma vez
eu prefiro o delírio
espalhado pelo óbvio
existem outras formas de morrer
sem precisar nascer com vida
escrever por exemplo
deixar-se levar por palavras
mais fortes que a fala
só prova isso uma vez
eu prefiro o delírio
espalhado pelo óbvio
existem outras formas de morrer
sem precisar nascer com vida
escrever por exemplo
deixar-se levar por palavras
mais fortes que a fala
A DUREZA DO ABRAÇO
aprendi a abraçar
depois de morto
talvez tarde demais
o rigor morte
não permite
que me mova
de maneira adequada
permito-me abraçar
apenas o ar raro
e o escuro que me serve
de anteparo
depois de morto
talvez tarde demais
o rigor morte
não permite
que me mova
de maneira adequada
permito-me abraçar
apenas o ar raro
e o escuro que me serve
de anteparo
sexta-feira, 29 de junho de 2012
quinta-feira, 28 de junho de 2012
POEMA ENTALADO
o poema entalado
na goela do silêncio
com água
tentam empurrá-lo
mas ele só entende
de incêndios
na goela do silêncio
com água
tentam empurrá-lo
mas ele só entende
de incêndios
AO INFINITO
depois das flores
os jatos de neon
perfilam tensos
troncos amanhecidos
talvez de árvores
talvez de homens
erguem os braços os galhos
em direção ao infinito
para onde foram as copas das árvores
as cabeças dos homens
eu já fui também
os jatos de neon
perfilam tensos
troncos amanhecidos
talvez de árvores
talvez de homens
erguem os braços os galhos
em direção ao infinito
para onde foram as copas das árvores
as cabeças dos homens
eu já fui também
HÁBITO
desde pequeno mastigo arames
geralmente farpados
em silêncio rumino
as contrações explodindo
desde pequeno defeco arames
geralmente lisos
aos gritos expelindo
trilhas e traças construindo
desde pequeno me alimentam
com arames e vidros e pedras
geralmente separo o arame
de tudo que não presta
expurgo as pedras e os vidros
e as palavras que me restam
geralmente farpados
em silêncio rumino
as contrações explodindo
desde pequeno defeco arames
geralmente lisos
aos gritos expelindo
trilhas e traças construindo
desde pequeno me alimentam
com arames e vidros e pedras
geralmente separo o arame
de tudo que não presta
expurgo as pedras e os vidros
e as palavras que me restam
terça-feira, 26 de junho de 2012
PORTAS
há milhares de anos
uma porta ergueu-se
entre mim e o nada
a poesia é a chave
construo mãos
usando palavras inacabadas
circundo a maçaneta
com meus cinco medos
deveriam ser os dedos
com eles fixo o meu corpo
entre a madeira e o osso
uma porta ergueu-se
entre mim e o nada
a poesia é a chave
construo mãos
usando palavras inacabadas
circundo a maçaneta
com meus cinco medos
deveriam ser os dedos
com eles fixo o meu corpo
entre a madeira e o osso
quinta-feira, 21 de junho de 2012
SALA DE ESPERA
na sala de espera
espera-se de quem espera
que leia alguma coisa
prefiro ficar pensando
para pensar não preciso de idéias
preciso de idéias para escrever
embora muitos escrevam
sem ter idéia alguma
embora muitas idéias
nem sejam escritas
na sala de espera
quem não tem idéia
desespera-se
prefiro ficar pensando
em ter alguma idéia
espera-se de quem espera
que leia alguma coisa
prefiro ficar pensando
para pensar não preciso de idéias
preciso de idéias para escrever
embora muitos escrevam
sem ter idéia alguma
embora muitas idéias
nem sejam escritas
na sala de espera
quem não tem idéia
desespera-se
prefiro ficar pensando
em ter alguma idéia
TRANSMUTAÇÃO
a agulha atravessa a minha pele
alcança o osso e atinge a alma
e a acaricia ao invés de sugá-la
uma alma
com a marca de agulha nas costas
quem a encontrar
avise que está morta
alcança o osso e atinge a alma
e a acaricia ao invés de sugá-la
uma alma
com a marca de agulha nas costas
quem a encontrar
avise que está morta
terça-feira, 19 de junho de 2012
MORDIDA
a copa da árvore sem a árvore
flutuando entre o meio-fio e a foto
de boca aberta espero algo que eu possa morder
pode ser algo como essa passagem
entre a paisagem e o sono
algo que não tema os meus dentes
algo que queira morrer ao dar prazer
flutuando entre o meio-fio e a foto
de boca aberta espero algo que eu possa morder
pode ser algo como essa passagem
entre a paisagem e o sono
algo que não tema os meus dentes
algo que queira morrer ao dar prazer
segunda-feira, 18 de junho de 2012
ENTRE AS ALAMEDAS
não sei andar de bicicleta
talvez por isso eu não tenha
o equilíbrio necessário para o choro
toda essa água em que me movo
é tudo pedra
meu oceano é minúsculo
quase não pesa
mesmo quando suo ou quando chovo
são aparas colhidas de outro sonho
se caminho trôpego pela alameda
quando deveria estar voando
imploro aos que encontraram as minhas asas
para que as esqueçam engavetadas
talvez por isso eu não tenha
o equilíbrio necessário para o choro
toda essa água em que me movo
é tudo pedra
meu oceano é minúsculo
quase não pesa
mesmo quando suo ou quando chovo
são aparas colhidas de outro sonho
se caminho trôpego pela alameda
quando deveria estar voando
imploro aos que encontraram as minhas asas
para que as esqueçam engavetadas
sexta-feira, 15 de junho de 2012
A FOME E O FOGO
os fios que formam
a face do fogo
bebem na mesma fonte
dos fios que formam
a face da fome
então o fogo
é a outra forma de olhar a fome
então o que queima no faminto
não é a revolta
pela presença da fome
o que queima é esse fogo
que bebe na mesma
fonte da fome
a face do fogo
bebem na mesma fonte
dos fios que formam
a face da fome
então o fogo
é a outra forma de olhar a fome
então o que queima no faminto
não é a revolta
pela presença da fome
o que queima é esse fogo
que bebe na mesma
fonte da fome
quinta-feira, 14 de junho de 2012
PEDAÇO DE AZUL
o pedaço de azul
descascou a nuvem
depois se juntou a outras
e se precipitou
chover é natural de quem espera
estiar é natural de quem chegou
descascou a nuvem
depois se juntou a outras
e se precipitou
chover é natural de quem espera
estiar é natural de quem chegou
MODO DE USAR AS PERNAS
pouco uso as pernas
para me mover uso a cabeça
fecho os olhos e estou em Tóquio
colho uma flor no Gabão
penduro o chão
nas minhas pernas
arrasto o mundo
em minha direção
para me mover uso a cabeça
fecho os olhos e estou em Tóquio
colho uma flor no Gabão
penduro o chão
nas minhas pernas
arrasto o mundo
em minha direção
SOTERRADO
toda tarde
chove embaixo
da mesma árvore
todo abrigo
sabe o que é preciso
mesmo soterrado
a terra não sai
do meu lado
chove embaixo
da mesma árvore
todo abrigo
sabe o que é preciso
mesmo soterrado
a terra não sai
do meu lado
segunda-feira, 11 de junho de 2012
SALITRE
quem não tem o mar
para chorar
não tem onde guardar
o sal da lágrima
por dentro
salga a alma e a estica
num lugar
onde o sol
não possa alcançar
para chorar
não tem onde guardar
o sal da lágrima
por dentro
salga a alma e a estica
num lugar
onde o sol
não possa alcançar
PRAIA
a praia que se adensa
tremula
tal qual uma bandeira
o dia me espia surpreso
porque a poesia me ensinou
a passar da hora de morrer
tremula
tal qual uma bandeira
o dia me espia surpreso
porque a poesia me ensinou
a passar da hora de morrer
LEVE
se eu fosse livre
seria leve
estou preso a esse vôo
e se pareço parado
é porque os olhos
que me enxergam
estão fechados
meu vôo é breve
a sua vírgula
é o infinito
seu ponto final
ainda não me escreveu
seria leve
estou preso a esse vôo
e se pareço parado
é porque os olhos
que me enxergam
estão fechados
meu vôo é breve
a sua vírgula
é o infinito
seu ponto final
ainda não me escreveu
sexta-feira, 8 de junho de 2012
AXIOMA
não adianta capricho
os meses retocados
estocados uns sobre os outros
iludem formando anos
nada se amontoa
escorre sob nossas peles
o sangue do axioma recortado
os meses retocados
estocados uns sobre os outros
iludem formando anos
nada se amontoa
escorre sob nossas peles
o sangue do axioma recortado
PRIMEIROS MOVIMENTOS
veja como ficou
quem diria que ficaria dessa maneira
ninguém imaginava
nem eu mesmo
queria dizer outras palavras
mas o tempo não deixou
o corpo não deixou
o máximo que consegui foi isso
espero a sua opinião
caso queira manifestá-la
ou então deixa pra lá
assim como eu deixei
fico observando
não digo mais nada
quem diria que ficaria dessa maneira
ninguém imaginava
nem eu mesmo
queria dizer outras palavras
mas o tempo não deixou
o corpo não deixou
o máximo que consegui foi isso
espero a sua opinião
caso queira manifestá-la
ou então deixa pra lá
assim como eu deixei
fico observando
não digo mais nada
quarta-feira, 6 de junho de 2012
QUANDO O MEDO ACENDER
quando o coração
acender o medo
lembre que há no corpo
outras partes
que poderão soprar o medo
existem outras partes
do teu corpo
e existem outros corpos
em toda parte
podem usar teu coração
como um segredo
soprar adrenalina
estricnina ou vaselina
apagar o medo
de qualquer parte
acender o medo
lembre que há no corpo
outras partes
que poderão soprar o medo
existem outras partes
do teu corpo
e existem outros corpos
em toda parte
podem usar teu coração
como um segredo
soprar adrenalina
estricnina ou vaselina
apagar o medo
de qualquer parte
JARDIM DA INFÂNCIA
um adulto nos penetra
assim termina a nossa infância
trancada numa sala
à prova de som
a psicologia é noturna
não funciona durante o dia
em vão ampara o silêncio
utilizando palavras
que não apagam
as manchas de esperma
na alma
assim termina a nossa infância
trancada numa sala
à prova de som
a psicologia é noturna
não funciona durante o dia
em vão ampara o silêncio
utilizando palavras
que não apagam
as manchas de esperma
na alma
segunda-feira, 4 de junho de 2012
NÃO LEIA
não tá a fim de ir
não vá
não tá a fim de morrer
não morra
não tá a fim de ler
não leia
agora
não venha exigir
palavras
onde o silêncio
é a melhor
maneira de dizer
não vá
não tá a fim de morrer
não morra
não tá a fim de ler
não leia
agora
não venha exigir
palavras
onde o silêncio
é a melhor
maneira de dizer
BOLO FECAL
poesia é água
ajuda na formação do bolo fecal
mas isso é lá coisa que se ponha
numa poesia
vão dizer
então direi que
a morte também é água
e ajuda na formação do bolo fecal
da alma
ajuda na formação do bolo fecal
mas isso é lá coisa que se ponha
numa poesia
vão dizer
então direi que
a morte também é água
e ajuda na formação do bolo fecal
da alma
sexta-feira, 1 de junho de 2012
TROCA DE OLHARES
deposito meus olhos sobre a mesa
recebo um troco maior
guardo a paisagem que sobra
no bolso esquerdo
saco outros olhos
do bolso direito
está sujo de dinheiro
suficiente para a passagem
aonde vou não preciso de olhares
espero que aceitem
minhas mãos como pagamento
no bolso da camisa
guardo todos os acenos
recebo um troco maior
guardo a paisagem que sobra
no bolso esquerdo
saco outros olhos
do bolso direito
está sujo de dinheiro
suficiente para a passagem
aonde vou não preciso de olhares
espero que aceitem
minhas mãos como pagamento
no bolso da camisa
guardo todos os acenos
QUERIA DIZER QUE SOU A CHUVA
a chuva debalde
interpretando a paisagem
molhando as rusgas
não é bem isso
o que eu queria dizer
meus pés alcançam um brilho
onde o trem guarda o estio
não sou tão rápido
sigo o arrepio
como quem sonha com
uma morte feliz
ainda não sei se é isso
o que eu queria dizer
caio oblíquo
perpendicular à chuva
escorro sem destino
interpretando a paisagem
molhando as rusgas
não é bem isso
o que eu queria dizer
meus pés alcançam um brilho
onde o trem guarda o estio
não sou tão rápido
sigo o arrepio
como quem sonha com
uma morte feliz
ainda não sei se é isso
o que eu queria dizer
caio oblíquo
perpendicular à chuva
escorro sem destino
quinta-feira, 31 de maio de 2012
HERANÇA
colhi as flores de pedra
colhi os frutos cinzentos
colhi onde começa o mundo
colhi tudo que não foi dito
revirei os escombros
e em nada disso me encontrei
colhi os frutos cinzentos
colhi onde começa o mundo
colhi tudo que não foi dito
revirei os escombros
e em nada disso me encontrei
quarta-feira, 30 de maio de 2012
SR MERDA
estava distraído
quando foi comido
não tinha a menor idéia
do que era ser mastigado
não tinha a menor idéia
do que era ser engolido
ou do que era ser digerido
não tinha a menor idéia
do que era ser defecado
agora sabe de tudo
e entende tudo
que conheceu por dentro
tudo ficou esclarecido
e da maneira que ficou
sabe que nunca mais
será comido
quando foi comido
não tinha a menor idéia
do que era ser mastigado
não tinha a menor idéia
do que era ser engolido
ou do que era ser digerido
não tinha a menor idéia
do que era ser defecado
agora sabe de tudo
e entende tudo
que conheceu por dentro
tudo ficou esclarecido
e da maneira que ficou
sabe que nunca mais
será comido
terça-feira, 29 de maio de 2012
UM LUGAR
enquanto me aguardo
lembro de um bom lugar
onde eu mantinha as pernas suspensas
e o corpo pendurado pela água
nem sei se o lugar existe
mas o lugar tem mais importância
do que a sua existência
lembro de um bom lugar
onde eu mantinha as pernas suspensas
e o corpo pendurado pela água
nem sei se o lugar existe
mas o lugar tem mais importância
do que a sua existência
MORDER É MELHOR QUE SORRIR
prefiro morder a sorrir
o riso não me alimenta
pelo contrário
provoca sempre ligações
com algo que provocará fome
melhor morder antes
o riso não me alimenta
pelo contrário
provoca sempre ligações
com algo que provocará fome
melhor morder antes
segunda-feira, 28 de maio de 2012
VENTO
é de vento
o material utilizado
na formação do tempo
talvez por isso se acumule
entre os furos da morte
e do futuro
o material utilizado
na formação do tempo
talvez por isso se acumule
entre os furos da morte
e do futuro
MARCA DO MUNDO
o mundo passa
deixa a marca
em nossos rostos
escondemos nossos mortos
de um mundo
que não temos
deixa a marca
em nossos rostos
escondemos nossos mortos
de um mundo
que não temos
MOMENTO DE FELICIDADE
a morte não pensa em mim
também não penso nela
prolongo o meu olhar
até onde posso alcançar
faço o mesmo com a respiração
meu coração tenta
um ritmo diferente
mas a alma não acompanha
a felicidade é um momento
que não percebemos
também não penso nela
prolongo o meu olhar
até onde posso alcançar
faço o mesmo com a respiração
meu coração tenta
um ritmo diferente
mas a alma não acompanha
a felicidade é um momento
que não percebemos
sexta-feira, 25 de maio de 2012
FACA DA PALAVRA
nem tudo que corta
gosta de sangue
também nem toda palavra
gosta de ser poema
a palavra que cobre o pensamento
e se mostra quase compreensível
é pincelada de espanto
e corte desprezível
para que se torne poema
melhor continuar a palavra
representando uma faca
que penetra no espaço em branco
mostrando um sangue
que nunca se acaba
gosta de sangue
também nem toda palavra
gosta de ser poema
a palavra que cobre o pensamento
e se mostra quase compreensível
é pincelada de espanto
e corte desprezível
para que se torne poema
melhor continuar a palavra
representando uma faca
que penetra no espaço em branco
mostrando um sangue
que nunca se acaba
quinta-feira, 24 de maio de 2012
A DOR E SUA INUTILIDADE
dói menos
não servir pra nada
enxergar a dor em um poema
ou em qualquer palavra
é um exagero
a dor não precisa
dessa rotina
entre nascer e morrer
ela de encaixa
e não se deixa morrer
por ser a mais humana
sobrevive ao que é visto
engolindo os cacos da calma
não servir pra nada
enxergar a dor em um poema
ou em qualquer palavra
é um exagero
a dor não precisa
dessa rotina
entre nascer e morrer
ela de encaixa
e não se deixa morrer
por ser a mais humana
sobrevive ao que é visto
engolindo os cacos da calma
terça-feira, 22 de maio de 2012
sexta-feira, 18 de maio de 2012
EXUBERANTE
o céu me navega
sem me negar
se é que me ergue
sou profundo
inabalável modo
de ser profuso
sem me negar
se é que me ergue
sou profundo
inabalável modo
de ser profuso
quinta-feira, 17 de maio de 2012
CLARIDADE
a claridade interrompe as abóbodas
colunas de ar mastigam a tarde
procuro as penas de qualquer asa
o vôo cumprirá parte do sonho
sempre que fui triste me neguei
noutros momentos tive a claridade
passo em falso alimenta
a atmosfera que amedronta
não vale a pena ser triste
ser alegre paralisa
melhor ficar assim
entre um poema e outro
como se a vida desaguasse
colunas de ar mastigam a tarde
procuro as penas de qualquer asa
o vôo cumprirá parte do sonho
sempre que fui triste me neguei
noutros momentos tive a claridade
passo em falso alimenta
a atmosfera que amedronta
não vale a pena ser triste
ser alegre paralisa
melhor ficar assim
entre um poema e outro
como se a vida desaguasse
PENSAMENTO LIVRE
meu pensamento livre
aprisiona a palavra
entre o olho e a página
meu pensamento livre
é solitário
ao conhecer outro
aprisiona-se
meu pensamento livre
deixa sempre
alguma coisa no caminho
quem não me ouve
sabe do que é feito
meu pensamento livre
aprisiona a palavra
entre o olho e a página
meu pensamento livre
é solitário
ao conhecer outro
aprisiona-se
meu pensamento livre
deixa sempre
alguma coisa no caminho
quem não me ouve
sabe do que é feito
meu pensamento livre
quarta-feira, 16 de maio de 2012
SÉCULO 21
as pessoas pensam que
as pessoas mais velhas
sabem mais
é verdade
os mais velhos sabem mais
sabem inclusive que afirmar
que os mais velhos sabem mais
é uma tolice
as pessoas mais velhas
sabem mais
é verdade
os mais velhos sabem mais
sabem inclusive que afirmar
que os mais velhos sabem mais
é uma tolice
as pessoas pensam que
quem escreve
sabe tudo
não é verdade
justamente por não saber de nada
é que as pessoas escrevem
o aprendizado consiste em escrever
quem escreve
sabe tudo
não é verdade
justamente por não saber de nada
é que as pessoas escrevem
o aprendizado consiste em escrever
as pessoas pensam que
sonhar requer um esquema
algumas vezes sim
requer cansaço e insônia
sonhar requer um esquema
algumas vezes sim
requer cansaço e insônia
as pessoas pensam que
amanhã o dia será diferente
não é verdade
amanhã o dia será igual ao de hoje
e o de hoje será igual ao de amanhã
amanhã o dia será diferente
não é verdade
amanhã o dia será igual ao de hoje
e o de hoje será igual ao de amanhã
a raiva que arranha
ou a alegria que cicatriza
são sujeiras que a paisagem se permite
mas não se altera
nem altera o olhar
ou a alegria que cicatriza
são sujeiras que a paisagem se permite
mas não se altera
nem altera o olhar
ESCOLHAS
então a sua escolha foi essa
o que foi descartado nem existe mais
reimprimir sobre a página já impressa
vai tornar o texto confuso
resta ler o que sobrou
de preferência em voz alta
a vida não permite
leituras silenciosas
nem textos com ponto final
o que foi descartado nem existe mais
reimprimir sobre a página já impressa
vai tornar o texto confuso
resta ler o que sobrou
de preferência em voz alta
a vida não permite
leituras silenciosas
nem textos com ponto final
terça-feira, 15 de maio de 2012
O ZÍPER DO CÉU
quando descobri
o zíper do céu
já era tarde
a terra já havia
me engolido
das flores terminais
que enfeitam esse estômago
no qual me vejo perdido
brotam o som
de um céu antigo
o zíper do céu
já era tarde
a terra já havia
me engolido
das flores terminais
que enfeitam esse estômago
no qual me vejo perdido
brotam o som
de um céu antigo
RISCO DA ESCURIDÃO
a escuridão reduz
os riscos de estrondos
porque a escuridão
é a luz quando implode
o tato um dos fragmentos
o tropeço outro fato
lembra o sabor do sol
morder a luz por dentro
os riscos de estrondos
porque a escuridão
é a luz quando implode
o tato um dos fragmentos
o tropeço outro fato
lembra o sabor do sol
morder a luz por dentro
segunda-feira, 14 de maio de 2012
ALMA DO POETA
poeta não precisa de alma
a poesia é o seu corpo
e a alma forma-se no espaço
entre o poema e o olho
a poesia é o seu corpo
e a alma forma-se no espaço
entre o poema e o olho
sexta-feira, 11 de maio de 2012
DESMAIO - poema de G.VIEIRA
veio maio sem mais
nem menos desmaios
da dor
de saber-se nada
sem mês, sem mais
maio vem
aos poucos mortais
que vivem em desmaios
de terem demais
todos os maios
para tão desiguais
visitem www.todapalavratoda.blogspot.com
nem menos desmaios
da dor
de saber-se nada
sem mês, sem mais
maio vem
aos poucos mortais
que vivem em desmaios
de terem demais
todos os maios
para tão desiguais
visitem www.todapalavratoda.blogspot.com
MISTURADO AOS RESTOS
as estrelas
não entendem
o meu brilho
sob os seus pés
mistura-me aos restos
dos cigarros
sou a mera fumaça
que a luz atravessa
e me despedaça
não entendem
o meu brilho
sob os seus pés
mistura-me aos restos
dos cigarros
sou a mera fumaça
que a luz atravessa
e me despedaça
RESOLUÇÃO
foi resolvido pelo sangue
onde posso morrer
todos esses furos
conto como pedaços
dentre todos os objetos
palavras sem mim
encaminham o meu fim
onde posso morrer
todos esses furos
conto como pedaços
dentre todos os objetos
palavras sem mim
encaminham o meu fim
quinta-feira, 10 de maio de 2012
JARDINS SUSPENSOS
sem palavras
suspendo os jardins
mas as flores não caem
irrigo o vazio
com o que crio
JARDIM
observe como
eu manipulo as folhas
faço parecerem flores
sem as limitações
das cores
manipulo as folhas
como se eu
fosse verde
eu manipulo as folhas
faço parecerem flores
sem as limitações
das cores
manipulo as folhas
como se eu
fosse verde
quarta-feira, 9 de maio de 2012
MANUAL PARA O GRITO PERFEITO
alguns escrevem
para não morrer
outros para lembrar
escrevo
porque não aprendi
a gritar
para não morrer
outros para lembrar
escrevo
porque não aprendi
a gritar
terça-feira, 8 de maio de 2012
DESENHOS DE CHUVA
a árvore desenha a chuva
a chuva desenha os meus olhos
meus olhos bóiam na água
bóiam na água salgada
de quem pescá-los
espero clemência
a chuva desenha os meus olhos
meus olhos bóiam na água
bóiam na água salgada
de quem pescá-los
espero clemência
POR ENQUANTO OSSOS
cogito
logo ergo o sol
utilizando os pés
deixo as mãos livres
para o poema
e outras coisas pequenas
como a vida ou uns abraços
e demais gestos
que parecem preciosos
mas não passam
dos ossos que a morte usa
enquanto espera a pele crescer
logo ergo o sol
utilizando os pés
deixo as mãos livres
para o poema
e outras coisas pequenas
como a vida ou uns abraços
e demais gestos
que parecem preciosos
mas não passam
dos ossos que a morte usa
enquanto espera a pele crescer
segunda-feira, 7 de maio de 2012
MAIS PARADO QUE A CHUVA
o tempo me deixa parado
mais parado que a chuva
quando tremula por dentro
parece um sentimento
esse vento que tremula por dentro
mas é só o vento
mais parado que a chuva
quando tremula por dentro
parece um sentimento
esse vento que tremula por dentro
mas é só o vento
EQUAÇÕES
existem inúmeras
equações sem soluções
a poesia é uma delas
o x da questão
são as palavras
cada letra uma incógnita
a ser desvendada
equações sem soluções
a poesia é uma delas
o x da questão
são as palavras
cada letra uma incógnita
a ser desvendada
sexta-feira, 4 de maio de 2012
DE OLHOS FECHADOS
quem abre os olhos
enxerga principalmente
o que não deseja
até um cego encontra
abismos inesperados
eu mantenho os olhos
sempre fechados
enxergo abismos
enxergo palavras impronunciáveis
escrevo abismos
enxerga principalmente
o que não deseja
até um cego encontra
abismos inesperados
eu mantenho os olhos
sempre fechados
enxergo abismos
enxergo palavras impronunciáveis
escrevo abismos
quinta-feira, 3 de maio de 2012
ABORTO
nunca pensei em ser triste
não me lembro da minha prisão de água
não me lembro da luz na minha pupila dilatada
não lembro se pensei em ser triste
dizem que me dou bem com a vida
não sabem que disfarço bem minhas feridas
não sei me segurar na água
escorro pelos canos
alimento rios oceanos
o mundo absorve o meu sangue e me descarta
não me lembro da minha prisão de água
não me lembro da luz na minha pupila dilatada
não lembro se pensei em ser triste
dizem que me dou bem com a vida
não sabem que disfarço bem minhas feridas
não sei me segurar na água
escorro pelos canos
alimento rios oceanos
o mundo absorve o meu sangue e me descarta
ABERTO
eu precisava de um poema
faltou o ar
nem todas as janelas foram suficientes
o balão de oxigênio
misturado aos outros balões coloridos
meus pulmões doloridos
procurei palavras
só encontrei as erradas
para tudo que era certo
eu ia escrever aborto
escrevi aberto
faltou o ar
nem todas as janelas foram suficientes
o balão de oxigênio
misturado aos outros balões coloridos
meus pulmões doloridos
procurei palavras
só encontrei as erradas
para tudo que era certo
eu ia escrever aborto
escrevi aberto
DESPINDO A DOR
aos poucos
a dor se despe
e o que parece sangue
é nada mais que corte
e o que parece humano
é nada mais que morte
a dor se despe
e o que parece sangue
é nada mais que corte
e o que parece humano
é nada mais que morte
quarta-feira, 2 de maio de 2012
POR MAIS
por mais que eu mastigue
as palavras não tomam
a forma da minha boca
por mais que eu me intrigue
a morte não toma
a forma do meu corpo
por mais que eu escreva
as palavras não me tomam
permaneço dessa forma
as palavras não tomam
a forma da minha boca
por mais que eu me intrigue
a morte não toma
a forma do meu corpo
por mais que eu escreva
as palavras não me tomam
permaneço dessa forma
SE EU FOSSE UM RIO
se eu fosse um rio
seria largo
e quando respirasse
inundaria o mundo
se eu fosse um rio
seria claro
e quando me movesse
acalmaria o mundo
se eu fosse um rio
seria muito
e morreria como se coubesse
no mundo
seria largo
e quando respirasse
inundaria o mundo
se eu fosse um rio
seria claro
e quando me movesse
acalmaria o mundo
se eu fosse um rio
seria muito
e morreria como se coubesse
no mundo
terça-feira, 1 de maio de 2012
OS LADOS DA VIDA
às vezes
sinto a morte
em alguma parte
do meu corpo
algo para e apodrece
e alguma parte
da minha vida
nasce do outro lado
que esse corpo
desconhece
sinto a morte
em alguma parte
do meu corpo
algo para e apodrece
e alguma parte
da minha vida
nasce do outro lado
que esse corpo
desconhece
LÍQUIDO E VERMELHO
nunca mais cuspi sangue
porque não há mais sangue
a ser cuspido
o que corre
em minhas veias
são os gritos
dos meus sonhos
derretidos
porque não há mais sangue
a ser cuspido
o que corre
em minhas veias
são os gritos
dos meus sonhos
derretidos
segunda-feira, 30 de abril de 2012
OS IDIOMAS DA MINHA AVÓ
quando a minha avó
conversava com as plantas e as vacas
ainda não sabia
o idioma dos filhos
quando a minha avó
aprendeu o idioma dos filhos
e conversava com o pavor e as lágrimas
ainda não sabia
o idioma dos netos
quando a minha avó
conversava com os netos
já sabia o idioma do tempo e da sorte
e pensava que não havia
o idioma da morte
conversava com as plantas e as vacas
ainda não sabia
o idioma dos filhos
quando a minha avó
aprendeu o idioma dos filhos
e conversava com o pavor e as lágrimas
ainda não sabia
o idioma dos netos
quando a minha avó
conversava com os netos
já sabia o idioma do tempo e da sorte
e pensava que não havia
o idioma da morte
quinta-feira, 26 de abril de 2012
VISITANDO MAMÃE NO HOSPÍCIO
não tirei sua razão
deixei exatamente
onde nunca deveria estar
tentei me depositar
entre as maçãs
e a sua paisagem imaginária
fiquei pendurado para sempre
em seu olhar
deixei exatamente
onde nunca deveria estar
tentei me depositar
entre as maçãs
e a sua paisagem imaginária
fiquei pendurado para sempre
em seu olhar
quarta-feira, 25 de abril de 2012
DECÚBITO DORSAL
entendo o grito das formigas
tenho minha cabeça rente ao solo
minha boca o formigueiro
entendo o sabor das formigas
o zíper da minha boca destruído
meu paladar desarmado
entendo os passos das formigas
meu corpo seu caminho
tenho minha cabeça rente ao solo
minha boca o formigueiro
entendo o sabor das formigas
o zíper da minha boca destruído
meu paladar desarmado
entendo os passos das formigas
meu corpo seu caminho
GLÓBULOS
liberto meus glóbulos brancos
e os vermelhos
cortando a minha face no espelho
uso a lâmina d’água
da esquerda para a direita
do corte emanam mágoas
este lado que me aceita
entre a parede e a porta
o único espaço que me conforta
mas não suficientes
para os meus glóbulos brancos
nem os vermelhos
eles atravessam o espelho
cruzam as paredes do banheiro
e enfeitam um céu sem cor
nem brilho
e os vermelhos
cortando a minha face no espelho
uso a lâmina d’água
da esquerda para a direita
do corte emanam mágoas
este lado que me aceita
entre a parede e a porta
o único espaço que me conforta
mas não suficientes
para os meus glóbulos brancos
nem os vermelhos
eles atravessam o espelho
cruzam as paredes do banheiro
e enfeitam um céu sem cor
nem brilho
terça-feira, 24 de abril de 2012
CAL
todos bebem a minha cal
menos as paredes
todos querem o meu caos
menos a minha sede
onde termina o tronco
as vezes é a raiz
outras vezes é a copa
onde começa o tronco
ninguém sabe
muitas vezes uma poda
faz a copa parecer raiz
muitas vezes só um sopro
faz uma floresta infeliz
menos as paredes
todos querem o meu caos
menos a minha sede
onde termina o tronco
as vezes é a raiz
outras vezes é a copa
onde começa o tronco
ninguém sabe
muitas vezes uma poda
faz a copa parecer raiz
muitas vezes só um sopro
faz uma floresta infeliz
ALGUÉM NO MEU LUGAR
todas essas pessoas
que andam pelas minhas costas
sem saber por onde estão pisando
e pensam que caminham sobre a pele
mesmo quando ferem
todas essas pessoas
que me ultrapassam
e repousam o ventre antes
que eu nasça
entre todas essas pessoas
eu me incluo
e me deixo levar
enquanto alguém no meu lugar
pensa que a vida é boa
que andam pelas minhas costas
sem saber por onde estão pisando
e pensam que caminham sobre a pele
mesmo quando ferem
todas essas pessoas
que me ultrapassam
e repousam o ventre antes
que eu nasça
entre todas essas pessoas
eu me incluo
e me deixo levar
enquanto alguém no meu lugar
pensa que a vida é boa
sexta-feira, 20 de abril de 2012
ABERTURAS
acho que o meu sapato
está abrindo na frente
sinto um vento forte
no dedão do pé
acho que a minha cabeça
também está aberta
sinto um vento no cérebro
talvez por este motivo
eu esteja escrevendo isso
as flores sentem o vento
abrindo os seus botões
se é que o vento sabe
o que é uma flor
o poema sabe
quando a página
começa a abri-lo
se é que se pode
chamar isso de um poema
está abrindo na frente
sinto um vento forte
no dedão do pé
acho que a minha cabeça
também está aberta
sinto um vento no cérebro
talvez por este motivo
eu esteja escrevendo isso
as flores sentem o vento
abrindo os seus botões
se é que o vento sabe
o que é uma flor
o poema sabe
quando a página
começa a abri-lo
se é que se pode
chamar isso de um poema
quinta-feira, 19 de abril de 2012
A LUZ DO CEGO
enxergar não dá
sentido ao mundo
mesmo sem enxergar
o cego anda em linha reta
e o mundo não coroa o seu olfato
nem dá por perdida a sua meta
o tato abate o que é sentido
e o que se finge não tem papo
e o mundo ao redor do cego
e o mundo que ainda pensa
ser o centro
não entende o quanto é claro
o que é por dentro
sentido ao mundo
mesmo sem enxergar
o cego anda em linha reta
e o mundo não coroa o seu olfato
nem dá por perdida a sua meta
o tato abate o que é sentido
e o que se finge não tem papo
e o mundo ao redor do cego
e o mundo que ainda pensa
ser o centro
não entende o quanto é claro
o que é por dentro
quarta-feira, 18 de abril de 2012
CAMINHAR É SONHAR
onde deveria ser uma escada
mostrou-se possível uma alavanca
e a paisagem estragada
entre o primeiro passo e o último
acompanhou o movimento
como se o corpo e o momento
ocupassem o mesmo espaço
quem se mostra aos pedaços
sabe que o caminho é sonho
de uma cabeça esmagada
mostrou-se possível uma alavanca
e a paisagem estragada
entre o primeiro passo e o último
acompanhou o movimento
como se o corpo e o momento
ocupassem o mesmo espaço
quem se mostra aos pedaços
sabe que o caminho é sonho
de uma cabeça esmagada
EVIDÊNCIA HUMANA
alguns acreditam
que a evidência humana no poema
é a palavra
eu discordo
a evidência humana no poema
é o silêncio
e a maneira como ele se locomove
entre uma palavra e outra
que a evidência humana no poema
é a palavra
eu discordo
a evidência humana no poema
é o silêncio
e a maneira como ele se locomove
entre uma palavra e outra
terça-feira, 17 de abril de 2012
CHÃO ANÔNIMO
da superfície o que resta
demonstrações de delírios
e seus desencantos
paredes parecidas navegadas
leituras da carne em braile
olhar-me e confirmar inexeqüível
olhar-me sem encontrar nos meus olhos
a perda do plano
confiar no escuro
como os olhos confiam
no amontoado de vãos
confiar nas palavras
como os pés confiam
no anonimato do chão
demonstrações de delírios
e seus desencantos
paredes parecidas navegadas
leituras da carne em braile
olhar-me e confirmar inexeqüível
olhar-me sem encontrar nos meus olhos
a perda do plano
confiar no escuro
como os olhos confiam
no amontoado de vãos
confiar nas palavras
como os pés confiam
no anonimato do chão
segunda-feira, 16 de abril de 2012
FALHAS NO PAPEL
eu sempre quis
escrever abril
sem utilizar lápis ou caneta
consegui escrever abril
usando uma pena
que arranquei das asas de um anjo
dizem que os anjos não existem
a poesia também não existe
falhas no papel
produzem essas palavras
escrever abril
sem utilizar lápis ou caneta
consegui escrever abril
usando uma pena
que arranquei das asas de um anjo
dizem que os anjos não existem
a poesia também não existe
falhas no papel
produzem essas palavras
sexta-feira, 13 de abril de 2012
RITOS ARTIFICIAIS
entre os buracos
abertos entre
o olhar e a flor
interditaram a dor
instalando plásticos
abertos entre
o olhar e a flor
interditaram a dor
instalando plásticos
COMO FABRICAR DENTES
nem sempre quem sorri
entende a felicidade
confundem gestos e coisas
meus dentes postiços são de brim
lembram calças desvestidas
caminho por onde pereço
começo por onde mereço
termino com essa boca
parecida com a minha
o sorriso costurado a cru
a felicidade sempre
provocando esse choque
anafilático
entende a felicidade
confundem gestos e coisas
meus dentes postiços são de brim
lembram calças desvestidas
caminho por onde pereço
começo por onde mereço
termino com essa boca
parecida com a minha
o sorriso costurado a cru
a felicidade sempre
provocando esse choque
anafilático
ODE À NUVEM
o sol bebeu
todas as nuvens
o homem aceso
mostrou-se preocupado com o sim
concordar nesse momento era frio
o sol enfiado nos cabelos
os raios cobrindo os olhos
o homem diz sim à sombra
procura as nuvens sob ela
todas as nuvens
o homem aceso
mostrou-se preocupado com o sim
concordar nesse momento era frio
o sol enfiado nos cabelos
os raios cobrindo os olhos
o homem diz sim à sombra
procura as nuvens sob ela
quinta-feira, 12 de abril de 2012
ENGAVETADO
permaneci imóvel
esperando a respiração
voltar ao normal
mas a respiração
nunca mais voltou
a gaveta era fria
mas eu não senti
a gaveta era escura
mas eu não vi
esperando a respiração
voltar ao normal
mas a respiração
nunca mais voltou
a gaveta era fria
mas eu não senti
a gaveta era escura
mas eu não vi
quarta-feira, 11 de abril de 2012
ROSAS BORDADAS
o mundo ainda é o melhor lugar
pra se morar sozinho
espalhe tua pele sobre ele
e mostre as rosas
bordadas nos teus nervos
pra se morar sozinho
espalhe tua pele sobre ele
e mostre as rosas
bordadas nos teus nervos
MOSCAS
todas essas moscas
que brotam dos teus olhos
e se espalham pelo teu tronco
e os teus membros
tentam esconder
essa presença desagradável
das pessoas na tua vida
como se fossem feridas
que nunca cicatrizam
que brotam dos teus olhos
e se espalham pelo teu tronco
e os teus membros
tentam esconder
essa presença desagradável
das pessoas na tua vida
como se fossem feridas
que nunca cicatrizam
terça-feira, 10 de abril de 2012
MONTAGEM
perdi a manhã
montando o tempo
sobraram peças
que utilizo
pra montar
outros momentos
onde haja
o espaço
para o tempo
necessário
LINHA DE CHEGADA
não tenho vocação
para o suicídio
confio na vocação
dos assassinos
cruzo a linha de chegada
antes da hora
e espero os tiros
para o suicídio
confio na vocação
dos assassinos
cruzo a linha de chegada
antes da hora
e espero os tiros
segunda-feira, 9 de abril de 2012
ATENTO
o poeta deve permanecer
sempre atento
e ao mesmo tempo distraído
atento à claridade usando óculos escuros
atento à escuridão de olhos bem abertos
atento ao vácuo
e ao corpo que cai
de encontro ao solo
atento ao solo
sem o corpo
que flutua distraído
pelo espaço conhecido
sempre atento
e ao mesmo tempo distraído
atento à claridade usando óculos escuros
atento à escuridão de olhos bem abertos
atento ao vácuo
e ao corpo que cai
de encontro ao solo
atento ao solo
sem o corpo
que flutua distraído
pelo espaço conhecido
sexta-feira, 6 de abril de 2012
NADA DE PREOCUPAÇÕES
não se preocupe
nada vai mudar
a vida sempre nos surpreendendo
a morte sempre nos interrompendo
enquanto isso
leia algum poema
ou observe alguma estrela
ou não faça nada disso
não se preocupe
amanhã ou depois
o poema e a estrela
serão sempre os mesmos
como também serão os mesmos
os teus medos
nada vai mudar
a vida sempre nos surpreendendo
a morte sempre nos interrompendo
enquanto isso
leia algum poema
ou observe alguma estrela
ou não faça nada disso
não se preocupe
amanhã ou depois
o poema e a estrela
serão sempre os mesmos
como também serão os mesmos
os teus medos
quarta-feira, 4 de abril de 2012
MEDIDAS PREVENTIVAS
enterre o seu inimigo no quintal
a morte não garante o fim do mal
regue o túmulo com urina e escarro
não humilhe as flores reduzindo-as a um vaso
misture o ódio ao cimento armado
ao lado do buraco abra outro buraco
e enterre tudo que lembre o inimigo
deixe apenas o ódio do lado de fora
mesmo que não queira usar
o tempo vai te ensinar
porque o inimigo morto
não altera o sistema
mesmo inerte ele trará algum problema
por exemplo nunca deixe
ele ler esse poema
a morte não garante o fim do mal
regue o túmulo com urina e escarro
não humilhe as flores reduzindo-as a um vaso
misture o ódio ao cimento armado
ao lado do buraco abra outro buraco
e enterre tudo que lembre o inimigo
deixe apenas o ódio do lado de fora
mesmo que não queira usar
o tempo vai te ensinar
porque o inimigo morto
não altera o sistema
mesmo inerte ele trará algum problema
por exemplo nunca deixe
ele ler esse poema
terça-feira, 3 de abril de 2012
ESPERANDO A CHUVA
mesmo acordado
continue sonhando
manter a realidade nublada
nos prepara para a chuva
continue sonhando
manter a realidade nublada
nos prepara para a chuva
PINCELADAS
o mar cinzento
entre o céu azul
e a areia clara
os peixes pincelam
o mar por dentro
eu pincelo a poesia
por dentro
entre o céu azul
e a areia clara
os peixes pincelam
o mar por dentro
eu pincelo a poesia
por dentro
segunda-feira, 2 de abril de 2012
A POESIA NÃO PRECISA DE PALAVRAS
as palavras não me procuram
a poesia me encontra
e transformá-la em palavras
é torná-la nula
a poesia me encontra
e transformá-la em palavras
é torná-la nula
A POESIA FÁCIL
minha poesia é fácil
dá pra qualquer um
se quiser um orifício
eu faço
se quiser um falo
empalo
para quem tem palavra
tudo fica mais fácil
tudo no silêncio
fica mais difícil
espalho meu
corpo esplêndido
e o empalho
em silêncio
dá pra qualquer um
se quiser um orifício
eu faço
se quiser um falo
empalo
para quem tem palavra
tudo fica mais fácil
tudo no silêncio
fica mais difícil
espalho meu
corpo esplêndido
e o empalho
em silêncio
sexta-feira, 30 de março de 2012
MEMÓRIAS
e por falar nisso
melhor esquecer
sempre lembro
de coisas
que quero esquecer
esqueço coisas
que preciso lembrar
por falar nisso
melhor nem tocar
nesse assunto
vou terminar
lembrando de coisas
que preciso esquecer
PARA QUE SERVE O CORAÇÃO
depois que o amor acabou
descobriu que o coração
também serve pra bombear sangue
serve pra se entupir e colapsar
depois que o amor acabou
descobriu pra que serve
a caixa de lenço
na mesa do analista
depois que o amor acabou
descobriu que o amor acaba
sem deixar um lugar
pra ser preenchido
depois que o amor acabou
esqueceu como tudo começou
depois que o amor acabou
descobriu porque o poeta
não fala de amor
descobriu que o coração
também serve pra bombear sangue
serve pra se entupir e colapsar
depois que o amor acabou
descobriu pra que serve
a caixa de lenço
na mesa do analista
depois que o amor acabou
descobriu que o amor acaba
sem deixar um lugar
pra ser preenchido
depois que o amor acabou
esqueceu como tudo começou
depois que o amor acabou
descobriu porque o poeta
não fala de amor
quinta-feira, 29 de março de 2012
SIBÉRIA
o dia quase caindo da página
a toalha muda igual a ponte
por onde um velho barbudo sonhava
queria ser o rio
queria ser nada
nem sabia que era um homem
rasgou os braços
como se o sangue coubesse na margem
ditou os planos
voou fora da rima
aprisionou imagens
enquanto fingia descartá-las
o silêncio o temia
abria espaço para o velho calar
a toalha muda igual a ponte
por onde um velho barbudo sonhava
queria ser o rio
queria ser nada
nem sabia que era um homem
rasgou os braços
como se o sangue coubesse na margem
ditou os planos
voou fora da rima
aprisionou imagens
enquanto fingia descartá-las
o silêncio o temia
abria espaço para o velho calar
quarta-feira, 28 de março de 2012
RECOMEÇAR
pequenos escuros
esclarecem o retrato
pedaços de curvas deixadas
entre os cantos
parecem mostrar o fim
escolho começar
esclarecem o retrato
pedaços de curvas deixadas
entre os cantos
parecem mostrar o fim
escolho começar
PAREDE DE VIDRO
uma parede
de vidro
que surge
de repente
diante de um tolo
assim surge
o poema
diante do meu olho
e no rosto cortado
e no quebrado vidro
sangue misturado
com o outro lado
de vidro
que surge
de repente
diante de um tolo
assim surge
o poema
diante do meu olho
e no rosto cortado
e no quebrado vidro
sangue misturado
com o outro lado
terça-feira, 27 de março de 2012
O TAMANHO IDEAL
ainda não sou
do tamanho que desejo
tudo que cabe
deixou de ser o que é
e tornou-se esse
espaço ocupado
por outro nome
do tamanho que desejo
tudo que cabe
deixou de ser o que é
e tornou-se esse
espaço ocupado
por outro nome