quinta-feira, 19 de setembro de 2013

O CHEIRO DA CARNE DA MINHA MÃE

todo domingo é útil
se a carne necessária estiver presente
caminhamos pelo corredor quadriculado da toalha da mesa
soltando pequenos pedaços das lembranças
para não esquecermos o caminho de volta
cravamos o garfo no idioma pensado
e sentimos o molho descendo pelo olho
utilizamos a faca para separar o ontem do hoje
enquanto o punhal do futuro nos aprisiona ao passado
queremos a mesa farta de ilusões
queremos comer tudo mesmo com a boca costurada
bebemos a água da chuva enquanto nos evaporamos
brindamos com formigas as folhas de papel em branco
criamos irmãos entre um galho e outro
e das suas bocas os frutos que nos condenam
matam a nossa fome em doses lentas
todo domingo é necessário
se o cheiro estiver instalado
a auréola do peito comemora a boca perdida lá fora
enterramos nossos pés num quintal imaturo
usamos o restante do corpo como lápide
e marcamos o local com cuspe
gravamos nossos nomes nas costas da tarde
e ela nunca saberá os nossos nomes
retiramos os olhos para dormir
e os esquecemos para sempre em algum lugar
plantamos o que desejamos e esquecemos de regar
não sabemos de onde vem esse cheiro
queremos senti-lo para sempre
enquanto o pulmão só quer o oxigênio


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BEIRA DO LUGAR

vou aonde me cabe onde me sobra aonde me cobra estar por fora vou aonde me acende onde me entende onde me aguarda estar ausente vou aonde me...